No final
da Idade Média a cidade de Ourense semelha umha sociedade urbana muito mais convulsa do que
Alhariz. As atas notariais do concelho e do cabido, no século XV, mostram um
trasfundo de revoltas e luta de bandos que nom podia deixar de influir no
convívio com a judiaria, de resto muito integrada na cidade. Os Judeus de
Ourense aparecem na documentaçom como umha categoria diferenciada mas aceitada,
são tratados de “vecinos” e protegidos como tais polo concelho (1); como é
habitual, exercem ofícios de grande importância económica (arrecadadores de
rendimentos reais e senhoriais, comerciantes, prateiros (2); e desfrutam, de
resto, da precetiva liberdade (3) religiosa, dumha autonomia financeira que abeira
o autogoverno: em 1433, o ourive judeu Salomón protesta, perante o alcaide da
cidade, porque nom se respeitara o “uso et costume” de que quando se cobravam
impostos na cidade, os Judeus escolhiam um deles “a juramento en sua ley, pera
que vise ontre eles os ditos repartimentos”, e obtém do concelho a confirmaçom
da tradicional autonomia judaica: “mandava que des aqui en deante non se fesese
o dito repartimento sen estar o dito judío presente, pera que repartise os
ditos mrs. ontre eles” (4).
Os Judeus em Ourense viviam misturados com a populaçom |
Porém, o
concelho, que reconhecia a alfama, nom tolerava as manifestações de
anticristianismo. Em 1441, o alcaide tem preso o judeu Mosé Marcos, prateiro,
“por rasón que diso que disera yrisía e infamia contra Deus e Santa María,
disendo que Santa María parira tres veses”, e o procurador do concelho reclama
que o alcaide nom deixe de fazer justiça com ele (5). Se a tolerância significa
que a maioria aceita a religiom da minoria, demarcando-se polo tanto dos antijudeus,
com maior motivo resultará incompatível com o desrespeito judaico para com o
cristianismo. A irreverência dos Judeus, seja como for, revela que -ao igual
que em Alhariz no final do século XIII- para bem e para mal as duas etnias
reconheciam-se iguais, também para o mau. Sobre esta base alicerçava a política
de tolerância e de integraçom.
Em
Ourense, diferentemente de Alhariz, nom parece tão necessário organizar o
convívio separando ambas as comunidades: a tolerância recíproca organiza-se de jeito
mais natural, talvez cumha menor consciência de alteridade. Cristãos e Judeus
viviam mais misturados, sem dano de que os segundos fizessem respeitar
coletivamente os seus direitos quando convir. Tal integraçom explica porque, com
o tempo, as fraturas sociais tendem a produzir-se horizontalmente.
A
radicalizaçom das atitudes coletivas, consequência e causa do incremento da
conflitividade social em meados do século XV (6), como é que afeta em concreto à
boa vizinhança entre cristãos e Judeus?. Primeiro, desata-se a intolerância
nobiliar: o assalto à sinagoga en 1442. E, logo, produz-se a confraternizaçom
dentro da irmandade cidadã e popular de 1467. As prévias boas relações entre Judeus
e cristãos, entre a comunidade judaica e o concelho, empurram à cidade a tomar
partido pola sinagoga, e ao Judeus a porem-se do lado dos cidadãos na contenda
civil.
Carlos Barros, historiador galego especialista em história medieval da Galiza, exerce como professor de História Medieval na Universidade de Santiago de Compostela
Traduçom livre para o galego-português da
versom galega atualizada de “El otro admitido. La tolerancia hacia los
judíos en la Edad Media gallega”/Xudeus e conversos na historia. I.
Mentalidades e cultura (Congresso de Ribadávia, outubro 1991), Carlos Barros
(ed.), Santiago, 1994, pp. 85-115; “O outro admitido”, ¡Viva El-Rei! Ensaios
medievais, Vigo, 1996, pp. 75-115.
1 Anselmo LÓPEZ CARREIRA, “Os xudeos de Ourense no século XV”, Boletín Auriense, XIII, 1983, pp. 164-165.
2 ídem, p. 172.
3 A sinagoga da Rua Nova estava integrada no conjunto urbano e rodeada de casas habitadas por cristãos; há notícias sobre ela nos anos 1427, 1441, 1442 e 1474, ídem, pp. 161-162; para além de local de oraçom, era o sítio escolhido para ministrar a justiça que tinha a ver com a comunidade judaica (1457 e 1484), Xesús FERRO COUSELO, A vida e a fala dos devanceiros, II, Vigo, 1967, pp. 232-233.
4 Xesús FERRO COUSELO, op. cit., p. 227.
5 Xesús FERRO COUSELO, op. cit., pp. 228-229; a desconfianza do procurador do concello, figura institucional que en Ourense resposta a unha tradición de defensa do común, é, sobre todo, social, sen dúbida temían ou podían temer os veciños que o alcalde fixera a vista gorda dada a condición social do xudeu blasfemo.
6 O
ponto culminante é a insurreiçom de 1455, Mentalidad justiciera, pp. 32, 45.
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