sábado, 18 de novembro de 2023

SOBRE EDWARD SAID E O HAMAS

Edward Said, palestiniano nascido em 1935, em Jerusalém, durante o Mandato Britânico, foi um crítico literário e filósofo, talvez o mais conhecido intelectual palestiniano dos últimos cinquenta anos.

Edward Said (1935-2003) foi um ativista político palestiniano-estadunidense

A sua principal obra é 'Orientalismo', de 1978, mas a sua produçom é extensa e inclui muitas obras sobre a Questom Palestiniana, termo que ele ajudou à popularizar.

Ele faleceu em 2003, aos 67 anos de idade, em Nova Iorque, onde morava e trabalhava como professor da Universidade de Columbia. 

As reflexões do Said são sempre pertinentes para fugir da cilada de que criticar ou condenar o Hamas seria equivalente a nom apoiar a Palestina. Ele mostra muito bem, mais do que qualquer cidadão brasileiro, na verdade, que é plenamente razoável criticar e condenar o Hamas enquanto se apoia a Palestina. Ou alguém dirá que Said nom defendia um Estado nacional soberano palestino?


Em 'Peace and its descontents', de 1996 o Said escreveu:

"Quanto ao Hamas e às suas ações nos Territórios Ocupados, sei que a organizaçom é umha das únicas que expressa resistência e que o rapto do soldado dum exército ocupante é moralmente menos inaceitável do que raptar ou matar civis num autocarro. No entanto, para qualquer intelectual secular, fazer um pacto com o diabo com um movimento religioso é, penso eu, um substituto da conveniência  para o princípio. 

Um segundo ponto, talvez ainda mais importante, é que, enquanto resistência, tais ações pouco nos fazem bem e, exceto a Intifada, assemelham-se demasiado a toda a história da resistência palestiniana, cheia de perdas, heroísmo individual e nengum objetivo estratégico coordenado. Bombardear autocarros civis, por outro lado, é criminoso e inútil"

Na mesma obra, ele faz umha previsom que se provou acertada de conflito intrapalestino:

"O perigo iminente é que o governo de Arafat, se perpetuado, possa apenas produzir assassinatos, caos e guerra civil. O Hamas, a Jihad Islâmica e os vários grupos guerrilheiros baseados em Damasco nom conseguem agora realizar a mudança necessária, embora a probabilidade dum derramamento mais cruel de sangue seja extremamente elevada"

Na mesma obra Said lembra do papel de Israel em fortalecer o Hamas, justamente para criar umha divisom nos movimentos palestinianos. E critica o Hamas nos seguintes termos: 

"O Hamas é de facto um movimento de resistência contra a Ocupaçom e um movimento de protesto palestiniano. No entanto, se me perguntarem enquanto palestiniano, se o Hamas representa umha alternativa real ao nível do movimento nacional palestiniano, eu responderia imediata e inequivocamente que nom. A razom da minha resposta é que o Hamas nom possui umha visom de Palestina ou umha leitura da história fora das generalidades. Encontrei-me e falei com alguns dos seus representantes em Amã e nos Territórios Ocupados da Cisjordânia e de Gaza. Admiro a sua coragem, a sua força de vontade e a sua vontade de lutar, embora eu próprio seja contra o terror indiscriminado e as missões suicidas. No entanto, a questom de representar o povo palestiniano ou de construir umha corrente democrática que organize todos os segmentos do nosso povo está além das capacidades do Hamas"

As palavras de Said foram "É irônico que o Hamas, encorajado por Israel na década de 1980 como instrumento para quebrar a OLP e a Intifada, agora foi elevado ao posto de Super Diabo".

O HAMAS é umha organizaçom islamita que avoga pola violência pola violência

Já na obra 'Power, Politics, and Culture', umha coletânea de entrevistas, Said lembra também do papel social do Hamas. Ao mesmo tempo, ele comenta que esse papel social é, na verdade, a origem do uso da violência:

"O fundamentalismo islâmico começa como um protesto e depois ganha vida própria. Aparentam produzir oportunidades onde há desvantagens econômicas e estagnaçom política onde como cidadão nom possuem possibilidades"

Para ele, o papel social do Hamas "tem muito mais a ver com as consequências do Processo de Paz, com as consequências da Intifada, com as consequências da ocupaçom".

Finalmente, é nessa obra que está a crítica mais interessante de Said ao Hamas e ao Jihad Islâmica Palestiniana:

"São formas violentas e primitivas de resistência. O que Hobsbawm chama de pré-capital, tentando voltar às formas comunais, para regular a conduta pessoal com ideias reducionistas cada vez mais simplórias. Ora, nom sou nem um pouco a favor deles, e a violência pola violência deve ser absolutamente condenada, mas são essencialmente movimentos de protesto", no sentido de que são movimentos que surgem como consequência dumha condiçom.

Quando Said chama o Hamas de "primitivo", ele já se referia ao facto de que o Hamas nom tem princípios nacionais ou seculares. É um movimento fundamentalista, extremista e conservador. O seu braço armado segue uma ideia de guerra religiosa perene.


Essas são algumas das cousas que fazem nom compreender como pessoas que se dizem de esquerda no Brasil bradem coisas como "viva o Hamas" hoje. É umha visom superficial, quase fetichista, da Questom Palestiniana. E Said mostra bem isso.

Finalmente, alguém pode dizer que Said faleceu há duas décadas e que seria impossível saber a sua visom hoje sobre o Hamas. Correto, embora a sua esposa nom ache que seria muito diferente hoje

O facto é: Said foi um importante intelectual palestiniano que nom via o Hamas como um projeto viável ou de meios legítimos na sua luta, advogando pola violência pola violência.


Fonte: Xadrez Verbal via X (antigo Twitter)


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