"No mesmo mês em que as suas Majestades [Fernando e Isabel] emitiram o édito de que todos os Judeus deveriam ser expulsos do reino e dos seus territórios, no mesmo mês deram-me a ordem de empreender com homens suficientes a minha expediçom de descoberta das Índias". Assim começa o diário de Cristóvão Colombo. A expulsom a que Colombo se refere foi um evento tam cataclísmico que, desde entom, a data de 1492 foi marcada a ferro na história judaica. Em 31 de julho daquele ano, toda a comunidade judaica, cerca de 300.000 pessoas, foi expulsa dos reinos sob o domínio das Coroas de Castela e de Aragom.
Cópia assinada do édito de expulsom dos Judeus |
A expulsom dos Judeus fora o projeto favorito da Inquisiçom castelhana, chefiada polo padre dominicano Tomas de Torquemada. Torquemada acreditava que, enquanto os Judeus permanecessem em Castela, eles influenciariam dezenas de milhares de Judeus convertidos ao cristianismo a continuar praticando o judaísmo. Mais da metade dos Judeus do Reino de Castela converteram-se em consequência da perseguiçom religiosa, levantamentos antijudaicos e pogroms que ocorreram em 1391. Devido aos contínuos ataques, cerca de 50 000 outros se converteram em 1415. O antissemitismo sempre foi um motor do nacionalismo espanhol pan-castelhano.
Fernando e Isabel rejeitaram a exigência de Torquemada de que os Judeus fossem expulsos até janeiro de 1492, quando o exército castelhano derrotou as forças do Reino de Granada (o último estado muçulmano da Península Ibérica), restaurando assim o domínio cristão no território que controlavam. Com o seu projeto mais importante realizado, a rainha de Castela casada com o rei de Aragom, concluiu que os Judeus eram dispensáveis. Os reis católicos encargarom a Torquemada e aos seus colaboradores a redaçom do decreto de expulsom sob três condições que deveriam ficar refletidas no documento:
- que justificassem a expulsom imputando aos Judeus dous delitos suficientemente graves (a usura e a herética pravedade)
- que se desse um prazo suficiente para que os Judeus pudessem escolher entre o batismo ou o exilo
- os que se mantiverem fiéis ao Judaismo puidessem dispor dos seus bens móveis e imóveis (salvo ouro, prata e cavalos)
Torquemada apresentou o projeto de decreto aos monarcas a 20 de março de 1492 e os reis assinaram-no e publicaram-no em Santa Fe (Granada) a 31 de março. Existem duas versões: umha assinada polos reis e válida para a Coroa de Castela e outra assinada apenas polo rei Fernando de Aragom e valida para os seus estados da Coroa de Aragom. O decreto nom abrangia o Reino de Navarra, independente nessa altura.
A segunda parte do decreto pormenorizava as condições da expulsom:
- A expulsom dos Judeus era definitiva: "acordamos mandar sair todos os Judeus e Judeus dos nossos reinos e que jamais tornem nem voltem a eles nen algum deles".
- Nom havia qualquer exceçom, nem por razom de idade, morada ou local de nascença (incluídos tanto os nascidos em Castela e Aragom quanto os vindos de fora).
- Dava-se um prazo de quatro meses para que saissem dos domínios dos reis. Os que nom o fizerem dentro desse prazo ou voltassem depois seriam punidos sob pena de morte e a confiscaçom dos seus bens. Aliás, os que auxiliarem os Judeus ou os ocultassem expunham-se a perder "todos os seus bens, vassalos e fortalezas e outras heranças".
- No prazo fixado de quatro meses os Judeus poderiam vender os seus bens imóveis e levar o produto da venda em forma de notas promissórias (nom em moeda cunhada ou em ouro e prata porque a sua saída era interdita por lei) ou de mercadorias (sempre que nom forem armas ou cavalos, cuja exportaçom também era proibida.
Com certeza, todos os eventos iriam acontecer por causa da vontade implacável dum homem, Tomas de Torquemada.
Tomás de Torquemada (1420-98) |
Em 31 de março, foi expedido o decreto de expulsom, que deve entrar em vigor em exatamente quatro meses (31 de julho), mas por motivos logísticos o prazo foi alargado até o 2 de agosto. O curto espaço de tempo foi umha grande vantagem para os gentios, pois os Judeus foram forçados a liquidar as suas casas e negócios a preços absurdamente baixos. Ao longo daqueles meses frenéticos, os padres dominicanos encorajaram ativamente os Judeus a se converterem ao cristianismo e, assim, ganharem a salvaçom neste mundo e no próximo.
Dezenas de milhares de refugiados morreram enquanto tentavam chegar a um local seguro. Nalguns casos, os capitães de navios espanhóis cobraram somas exorbitantes e depois os Judeus foram jogados no mar no meio do oceano. Nos últimos dias antes da expulsom, espalharam-se boatos por toda a Espanha de que os refugiados em fuga engoliram ouro e diamantes, e muitos Judeus foram esfaqueados até a morte por bandidos na esperança de encontrar tesouros nos seus estômagos.
Diáspora sefardita
Os Judeus que rejeitaram abandonar a sua identidade etno-religiosa rumaram diversos destinos: Magrebe, Estados italianos, o Império Otomano e outros lugares da Europa, entre os quais, Portugal.
Os mais afortunados dos Judeus expulsos conseguiu escapar para o Império Otomano, onde receberam refúgio. Sabendo da expulsom, o sultam Bayezid II despachou a Marinha Otomana para trazer os Judeus em segurança para as terras otomanas, principalmente para as cidades de Salónica (atualmente na Grécia) e Izmir (atualmente na Turquia). Muitos desses Judeus também se espalharam noutras partes dos Balcãs sob domínio otomano, como as áreas que hoje som a Bulgária, a Sérvia e a Bósnia (nomeadamente a cidade de Sarajevo). A respeito desse incidente, Bayezid teria dito "aqueles que dizem que Fernando e Isabel som sábios son realmente tolos; pois ele deu-me, o seu inimigo, o seu tesouro nacional, ls Judeus", frisando que "o mesmo Fernando que empobreceu a sua própria terra e enriqueceu a nossa?" Entre os refugiados mais infelizes estavam aqueles que fugiram para o vizinho Portugal.
Doravante, os judeus espanhóis expulsos seriam conhecidos como sefarditas. Sefarad era o nome hebraico para a Espanha. Após a expulsom, os sefarditas impuseram-se umha proibiçom informal de os Judeus viverem novamente em Espanha. Especificamente porque a sua estada anterior naquele país tinha sido muito feliz, os Judeus consideraram a expulsom como umha traiçom terrível, e desde entom lembram-se dela com particular amargura. Das dezenas de expulsões dirigidas contra Judeus ao longo de sua história, a operada pola católica Espanha continua a ser a mais infame.
Validade do Decreto de Expulsom
O Decreto de Alhambra foi oficialmente revogado em 16 de dezembro de 1968, no Concílio Vaticano II. Logo a seguir, a 21 de dezembro de 1969, o ditador Francisco Frango derrogou-o oficialmente. Isso foi um século inteiro depois que os Judeus praticavam abertamente sua religiom em Espanha e as sinagogas eram mais umha vez locais legais de culto sob as Leis de Liberdade Religiosa ao abrigo da constituiçom de 1869. Em 1924, o regime de Primo de Rivera concedeu a cidadania espanhola a toda a diáspora judaica sefardita.
Em 2014, o governo do Estado do Reino de Espanha aprovou umha lei que permite a dupla cidadania aos descendentes de Judeus que se candidatam, para "compensar os eventos vergonhosos do passado do país". Assim, os Judeus sefarditas que podem provar que som descendentes dos Judeus expulsos por causa do Decreto de Alhambra podem "tornar-se espanhóis sem sair de casa ou desistir de sua nacionalidade atual."
Sem comentários:
Enviar um comentário