segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

ALHARIZ

Vila galega com cerca de 6.100 habitantes situada num outeiro à beira do rio Arnoia, coroada por um castelo do que hoje mal restam poucos vestígios. Esteve rodeada por umha muralha da qual se conservam alguns trechos.

Alhariz teve umha grande importância histórica, pois no século XI foi o berço da monarquia do Reino da Galécia-Leom. Nessa altura Afonso VI de Galécia-Leom ordena erguer o castelo e as muralhas. No século XII Afonso Reimondes (ou VII), primo de Afonso Henriques, concede-lhe à vila o foral, tornando-a em vila povoaçom de reguengo. O castelo de Alhariz foi residência real e local de educaçom dos príncipes e infantes da dinastia galaica.

Quer pola sua importância política, quer pola económica, em Alhariz achava-se umha das judiarias mais importantes da Galiza, a qual foi próspera e frutífera até o século XV a teor da sua excelente localizaçom estratégica que tornava a vila em "chave da Galiza" (segundo um privilégio de Sancho IV). 
Localizaçom das Judiarias de Alhariz. GoogleEarth
Durante o século XII os Judeus e cristãos viviam protegidos polas muralhas do castelo em ruas estremeiras, mas a tendência dos Hebreus ao isolamento fez com que se organizassem por volta da figura do rabino assentando-se no bairro de Sam Pedro (atualmente ruas Sam Láçaro, Porta de Vila Nova, Portelo da Barreira e Rua Arroleiro). Durante este primeiro período nom se pode falar propriamente em judiaria, já que as duas etnias estavam misturadas, embora a maioria de Judeus se concentrasse nesta zona.

Em 20 de maio de 1289 é assinado um acordo polo qual os dous povos, Judeus e cristãos, decidem viver separadamente. O surpreendente desta Carta de Avenza é que se trata dum acordo entre iguais e equitativo, acordando a mútua tolerância. Também se pactua separar as celebrações religiosas para que nengum judeu possa estar presente durante as procissões cristãs e que nengum cristão possa interromper a liturgia judaica. Do mesmo modo, acorda-se que nengum judeu possa viver com os cristãos e que nengum destes o faça na judiaria.

Este facto é todo um expoente da tolerância, já que ambas as partes se reconhecem mutuamente, aceitando que cada qual adore o seu d-us e, acima de todo, aceitando a religiom do outro. Nengumha das duas parece ter umha posiçom opressora, procurando apenas o convívio pacífico.

Nos 105 anos anteriores a este acordo era normal os Judeus troçarem das procissões católicas, insultando as imagens do Cristo e das virgens.  Por outro lado, os cristãos tentavam acima de todo interromper os atos religiosos judaicos ou incomodá-los durante o sabbatEstes aconteceres guardariam relaçom direta com a tradiçom e a lenda do fidalgo Xan de Arçua e a "Festa do Boi".
Ruas de âmbito judaico de Alhariz. GoogleMaps

Talvez se possa achar que estes atos som um indício dum mal convívio, porém, ao contrário: os Judeus e cristãos consideram-se iguais, o que torna lógico que se enfrentassem como iguais nas questões religiosas (no fim das contas, som os únicos atritos dos que existe prova). Um acontecimento como o de Alhariz, bem como noutros pontos da Galiza, teria suposto um linchamento sistemático dos Judeus em qualquer outra parte.

Cabe referir que a Carta de Avenza de Alhariz, ratificada polo Judeu-Mor e as autoridades civis e eclesiásticas locais, enquadra-se numha conjuntura de crise política e económica. Por um lado, a crise política derivada da morte de Afonso X e dos curtos reinados de Sancho IV (1284-95) e de Fernando IV (1295-1312), que deixaram desprotegidos os Judeus, e, por outro, a crise económica derivada dumhas más colheitas e um recuo na reconquista.

Após este acordo, alguns Judeus instalaram-se no bairro do Couto, embora a maioria o fez na zona de Subcastelo, quer fora das muralhas, quer nas proximidades da sinagoga e do cemitério judeu, construídos no século XII nuns terrenos cedidos com esse fim polo governo local. Este terreno estaria na atual Rua de Santo Estevo, mas tanto a sinagoga como o cemitério foram desmantelados após a expulsom de 1492.

Bairro do Couto

R. do Couto, na Judiaria de Alhariz. CAEIRO
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Praça do Couto, na Judiaria de Alhariz CAEIRO
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Bairro do Couto na Judiaria de Alhariz visto da Estrada de Junqueira. 
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Bairro do Couto, visto da R. Campo da Barreira. GoogleMaps
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O facto de localizar o bairro judeu de Alhariz na parte alta da vila dentro das muralhas alicerça-se em:
1. Pola referência ao castelo na Carta de Avenza, devendo localizar-se a judiaria baixo o castelo, talvez na encosta do outeiro sobre o que este se achava.
2. O facto de o cemitério estar localizado, em 1487, a 100 m de Sam Estevo. Igualmente, próxima de Sam Estevo acha-se atualmente a Rua Nova, antiga rua da Sinagoga.
Rua Nova
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Rua de Socastelo
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De resto, o documento autorizava expressamente os Judeus a utilizar as portas da cidade para introduzir os seus mantimentos: "e entrem os judeus pelas portas da vila para a Judiaria os vestimentos, que tiverem por mester", o que confirma a sua localizaçom intramuros.

Hoje conservam-se mui poucas habitações de origem medieval, mas possuem essa origem os pisos baixos dalguns prédios que som resultado de ampliações implementadas sobre antigos muros que conservaram em parte ou na sua totalidade. Em vários casos conservam-se ainda os ocos das portas nas que se podem olhar concavidades, quase sempre situados na ombreira direita.

Na primitiva judiaria, no número 33 da Rua de São Láçaro, conserva-se a fachada dumha casa de duas portas com as suas arestas biseladas que ainda têm repicadas partes da sua ombreira direita na porta mais estreita para facilitar o suo de chaves e fechos ainda permite reconhecer com clareza na sua aresta umha concavidade polida. Entre as duas portas desta casa pode-se reconhecer uns cruciformes gravados.
Casa dos sécs. XV-XVI, com concavidade e cruciformes gravados no lado direito na Judiaria de Alhariz.
E. Fonseca Moretón
Integrada numha casa mais moderna existe umha antiga porta, que tem a sua parte baixa murada e é utilizada como janela. Ao redor desta porta tem gravados na fachada vários números e letras, para além dumha cruz de converso de regular tamanho no seu lado esquerdo. Esta "janela" é seguramente umha mostra de dous momentos distintos: quando se grava a "cruz de converso", talvez no século XVI, e outro no século XVIII, pertencendo a umha abastada família de conversos, orgulhosa da sua condiçom de "bons cristão-novos".
Antiga porta com cruz de converso à esquerda e inscriçom do séc. XVIII sobre o lintel na Judiaria de Alhariz.
E. Fonseca Moretón

A casa do número 13 da Rua da Fonteirinha tem na sua ombreira esquerda umha concavidade e abaixo desta na fachada tem gravada umha "cruz de converso". Trata-se dumha habitaçom cujo andar baixo é muito mais velho do que o piso superior.
Porta com concavidade e cruz de converso à esquerda na Judiaria de Alhariz.
E. Fonseca Moretón
No número 14 da Rua Arroio conserva-se umha casa que tem umha porta do século XV de arco de meio ponto realizado com grandes aduelas e que, para além da concavidade na aresta da sua ombreira direita, tem umha inscriçom no lado desta na mesma peça de pedra e outra inscriçom no silhar contíguo, invertida, que diz: "ano 1713". Isto parece indicar que a casa deveu de ter sofrido umha reconstruçom nessa época, embora também poderia ter-se efetuado esta inscriçom diretamente sobre a pedra, tal como se acha hoje em dia, sem que a fachada tivesse sofrido qualquer derrubo. Lendo esta insecriçom ao invés, no sentido hebraico, pode-se enxergar a palavra shalom.
Casa dos sécs. XV-XVI com concavidade polida e inscriçom de 1713 invertida.
E. Fonseca Moretón
Na Rua Lobarinhas, na Rua Sul e na Rua das Hortas existem casas que têm nas suas portas, a maioria na ombreira direita, concavidades, embora algumhas o tenham na ombreira esquerda, ao igual que a da Rua Fonteirinha. Estas casas sofreram várias reconstruções no tempo e conservam nos seus pisos baixos os seus elementos mais antigos. Na Rua Sul duas casas possuem umhas peanhas semelhantes às existentes em Monção e Valença.

A Judiaria de Alhariz teve o seu esplendor até o início do século XV, a partir do qual, ao igual que o papel da vila, iria esmorecendo devagarinho, especialmente a partir da segunda metade do século, após a interdiçom de os Judeus exercerem cargos públicos e atividades profissionais, o que supôs o fim da Judiaria de Alhariz, facto que coincidiu com a cessom da jurisdiçom sobre vila ao Conde de Benavente realizada polo monarca Juán II de Catilla.

Após o édito de expulsom de 1492 foram mui poucos os que preferiram fugir para outros países, optando a maioria pola conversom ao cristianismo como cristãos-novos ou como praticantes, em segredo, do judaísmo.

Esta realidade subjaz na forma em que nom poucos alaricanos ainda hoje reconhecem que som naturais "da Ziralla", enquanto outros fazem troça disso dizendo o mesmo com certo desdém: "tu és da Ziralla" sem saber na realidade no que falam. Este jeito de nomear a Alhariz (Allariz em grafia castelhana), lendo de direita para esquerda, está implícita umha referência a supostos ou verdadeiros antecedentes judaicos. "Eu sou de sangue judeu dos que lêm ao invés: da Ziralla", ou bem "tu és da Ziralla, dos que lês ao invés: um judeu".

As principais atividades que conformam a fasquia do Parque Etnográfico do Rio Arnoia (moinho, tecidos, curtumes) evidenciam o que noutrora significou o modo de vida e a economia da zona, impulsionada polos Judeus e claramente ligada ao rio Arnoia. De resto, a confeitaria tradicional de Alhariz, com base nos amendoados, a torta real, a rosca de caço, os chocolates, os licores que se exalta na "Feira do doce, Amendoado e Melindre", como no caso de Ribadávia, foram introduzidos polos Judeus.

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