Na altura do 93º aniversário de Shimon Peres (2 de agosto), o Prémio Nobel, ex-Presidente e ex-primeiro-ministro de Israel falou com a RADIO JAI em temas como o terrorismo internacional, o mundo árabe, a ciência e a tecnologia ou a Europa e o mundo em geral. Até a sua morte o último sobrevivente dentre os fundadores do Estado de Israel desenvolveu um inesgotável trabalho no Centro Peres para a Paz.
RADIO JAI: Em Auschwitz, o Papa Francisco decidiu realizar unicamente umha prece em silêncio. No seu regresso formularam-lhe perguntas sobre o terroristmo e a violência na Europa. Respondeu que quando a gente nom encontra outra opçom, adere-se ao terrorismo. Também disse que o mundo está em guerra, mas que nom se trata dumha guerra entre religiões. O que o senhor pensa disto?
-SHIMON PERES: Acho que o terrorismo no mundo árabe é o alma dum protesto difícil de resolver. Eles sentem que o mundo os insultou; sentem que os mergulharam na pobreza, na ignorância, num local de cidadãos de segunda... Essa luta começou com as cruzadas. Eles dizem: vocês submeteram-nos, nós cortaremos-lhes a cabeça umha e outra vez e voltaremos a ser esse grande califado. Por isso resulta tam dificil combatê-los. Porque nom têm um senso de vida fora da guerra. O que têm é um protesto.
- Que tipo de protesto?
- Um protesto porque a cultura árabe e muçulmana foi colocada num local inferior, quando noutra altura eles foram a grande cultura e cimo do mundo. Entom todo o que nom é muçulmano é visto como o seu inimigo a destruir. Mas, por outro lado, nom som tantos como se acredita. Dos 400 milhões de Árabes no Próximo Oriente, estimamos que 50 ou 60.000 som terroristas. Muitos querem estudar ou som estudantes, querem entrar no novo mundo. O problema é quando se graduam nom arranjam onde trabalhar porque nesses países nom ha desenvolvimento nem alta tecnologia. Nós tentamos persuadi-los e ajudá-los para que façam o que nós fazemos. Nas nossas universidades os estudantes som estimulados para serem empreiteiros, nom apenas a estudar, mas a criar o trabalho. Temos 30.000 companhias nas nossas universidades de gente nova. Esta manhã estive com umha turma de jovens de 14 e 15 anos, que têm novas metodologias de comunicaçom como Snapchat; dous deles, de apenas 14 anos, criaram as suas próprias empresas. A inovaçom e a criatividade som estimuladas em Israel. Acho que em geral a ideia e paradigmas do aprendizado estám pouco claros e desatualizados, porque os especialistas falam no que já sucedeu. Nom temos especialistas nem docentes que falem no futuro, que possam ensinar o que irá acontecer. Existe algo na história judia; os Judeus nom gostaram dos reis, gostaram dos profetas, porque estes encararam o futuro. E por que? Porque o futuro sim pode ser mudado, o passado nom. Por isso, se quiseres ser um inovador e se quiseres melhorar o mundo, deixa o passado e concentra-te no futuro. Dedica-te a sonhar, projetar, criar e começa e recomeça umha e outra vez.
- E que se passa com o islám moderado?
- Nom se trata dos moderados. Trata-se dos velhos e dos novos. Os sunitas e os xiítas som velhos. Produzem um grande dano sobre eles próprios. Por exemplo, se decidem discriminar a mulher, decidem nom deixar sair os Arabes da miséria, deixam metade da popularçom mergulhada na ignorância e a pobreza. Se a mãe nom contar com educaçom ou nom educar os filhos, as crianças som as vítimas. Metade da populaçom está a tentar fugir dessa realidade de pobreza. A gente nova, nom os terroristas. Há mudanças significativas dentro do mundo árabe. Hoje, os 60% dos estudantes som mulheres jovens. De modo que há umha tendência à mudança. O problema é a imprensa, som os especialistas, eles som os que vivem permanentemente no passado. Nom se interessam com o futuro porque é desconhecido e a gente prefere lembrar o que previsível face o imprevisíbel. Lembrar em vez de pensar. Nom há nada a lembrar, nom digo a repeito dos aspetos espirituais que som tam importantes. O pessoal diz: se conhecermos os factos do passado nom cometeremos os velhos erros, mas isso é umha falsidade, porque, existe garantia de que se conhecemos os erros do passado nom iremos cometer novos erros e que estes sejam piores? Por isso o que se deve fazer é nom repetir, é criar, é ser umha startup nation, um país de inovaçom e criatividade.
- O senhor fala no futuro. Como ve o futuro da Europa e do mundo em geral?
- Estamos num momento de transiçom, dumha era para outra era. Antes, se um queria viver melhor e ser mais rico, precisava mais terra, mais território, porque a terra fornecia alimentos e a riqueza. A terra nom se conseguia debalde. Havia que lutar por ela e proteger as fronteiras. Terra e sangue eram elementos inseparáveis. Vivíamos na Era da Terra, porque a terra forncia alimento. A mistura da história da terra e a história do sangue som inseparáveis e a humanidade pagou um alto preço por ela. Agora, se tiveres muita terra e recursos naturais nom és grande cousa; podes ter recursos naturais, mas isso nom te torna rico. Agora estamos a entrar numha segunda era, a era da ciência. A ciência nom se conqusita com exérctios. É criada polo individuo. Podes ser um grande cientista sem pegar nada de ningúem, sem que o outro deva ser pobre. Os cientistas podem gerar umha revoluçom. E nom precisam pelejar. Nom precisam pegar nada de ningúem. A ciência pode ser criada por umha pessoa de maneira individual, nom depende de quem fores ou onde morares. Nom precisam de organizações. Olha, por exemplo, o que fez Mark Zukerberg, um garoto judeu de apenas 21 anos com boa cabeça: introduziu umha revoluçom mais poderosa do que a Revoluçom Russa ou a Revoluçom Francesa. Nom matou a ninguém, nom pegou nada de ninguém, nom tinha mapas, nem partido político, nem exérctiso, apenas umha boa cabeça. Quem pode saber com antecipaçom onde e quando nascem crianças assim? Os cientistas nom precisam pelejar. Mas necessitam fundos que os financiem. A ciência baseia-se na confiança muito mais do que na fortuna e os fundos. A ciência nom pode ser controlada por ninguém, já que a ciência é neutral. Por isso se precisa umha ciência que contenha moral para que nom caia nas mãos erradas. A ciência sem moral é um grande perigo. Acho que o mundo atravesa um período de mutaço, estamos a pagar um preço pola velha era e um preço pola nova era. Quanta mais gente no mundo árabe se envolver com o futuro, os resultados ver-se-ám mais claramente. Quando houver 60% de jovens inseridos no futuro, com 140 ou 160 de smartphones, eles verám o futuro dumha maneira absolutamente distinta aos seus pais.
- Os governos -e as suas lideranças- estám a ser questionados em todo o mundo. O que nos pode dizer do fenômeno Donald Trump e a possibilidade de ele se tornar em presidente dos Estados Unidos?
- Nom creio que essa seja umha eleiçom. Acho que é um modo de protesto contra os políticos dos dous lados, de direita e de esquerda. É mais um protesto do que um processo eleitoral. Donald Trump diz as asneiras mais grandes que eu jamais ouvi. Polo outro lado, Bernie Sanders é apenas um senhor judeu agradável que propõe ideias socialistas; se as tivesse dito há dez anos, teria sido enforcado. De modo que é um protesto. Os Estados Unidos vam transitar esse processo. Estados Unidos nom é umha ampla maioria, recebeu de mãos dadas muitos imigrantes. É um país de minorias que criou umha maioria democrática. Historicamente existem dous tipos de países: os que dam e os que tiram. Os Estados Unidos cresceram porque deram. A Europa foi destruída porque tirou. Os Estados Unidos nunca criaram um império. Lutaram por outros, sustentaram outros. Construiram pontes. A Europa construiu impérios e guerra. Os Estados Unidos tornaram-se num grande país porque souberam dar, isso está gravado profundamente no seu ADN. Agora a China vai-se tornar numha grande potência e tem hoje um debate interno invisível. Quando se tornarem grandes politicamente, nom apenas economicamente, farám-no dando ou tirando? Procurarám a harmonia ou o confronto? Se um tirar, cria-se inimigos. O melhor investimento na vida som os amigos. O maior esbanjamento, o ódio. Custa muito. E paga-se, paga-se, paga-se muito caro.
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