quarta-feira, 31 de agosto de 2016

AS LÍNGUAS DOS JUDEUS

O vindouro 4 de setembro celebra-se o XVII Dia Europeu da Cultura Judaica. Esta ediçom, a organizaçom e difusom de atividades relacionadas com a cultura judaica visam revelar as línguas dos Judeus. Com esse fim este dia têm organizado eventos em muitos países europeus. Fala-se em temas como os bairros judeus/judiarias ou a coexistência cultural, mostrando o património cultural e histórico do povo judeu.

Do hebraico para o grego, do ladino para o aramaico, do iídiche para o judeu-árabe, dos dialetos judeu-italianos para o russo, os Judeus, esse povo criado a partir da Palavra ouvida no Monte Sinai, sempre teve umha forte e felizmente contraditória relaçom com as línguas.

A seguir reproduz-se, na íntegra, o texto elaborado para promover e sensibilizar o público da realidade da cultura judia na sociedade dos países onde estám agendados eventos.


Hanna Lorer

A origem das línguas é umha questom fundamental em linguística. Umha das explicações religiosas da formaçom das línguas e da alfabetizaçom é que elas foram criadas por um homem santo, amado por D-us, alguém justo e confiável. A questom tem sido objeto de muitas discussões ao longo dos séculos. Devido à falta de fontes autênticas de informaçom, a descoberta de evidências sólidas tem sido incrivelmente difícil. Os investigadores antigos referem-se a sinais, gravados em fósseis vegetais ou animais ou em cerâmicas arqueológicas. Os dados derivados a partir destas fontes nom som o suficiente credíveis para fornecer respostas. Os investigadores que estudam o comportamento entre os primatas concluem que se comunicam, mas apenas através de sons inarticulados. Como resultado da evoluçom, os macacos tornaram-se progressivamente em humanos. A linguagem evoluiu junto com a evoluçom dos primatas para os seres humanos modernos. Em 1861, Max Müller publicou umha teoria especulativa sobre a origem da linguagem falada, supondo que se formou na imitaçom de sons, produzidos por animais ou aves, ou como resultado de exclamações, provocadas por reações emocionais a sentimentos de satisfaçom, surpresa, dor física,... Segundo ele os sons possuem umha vibraçom natural, ressonância, que acarreta um eco.

Atualmente existem cerca de 6900 línguas faladas identificadas no mundo, agrupadas em cerca de 20 famílias. Supõe-se que as diferentes línguas procedem dumha haste ou protolíngua pai. A identificaçom desta língua básica comum tem sido estudada há milhares de anos. Atualmente há 225 línguas locais faladas na Europa.

Os estudos de gênese das línguas estabeleceram umha tendência comum. Foi provado que várias línguas resultam da transformaçom das antigas línguas básicas, como a semita, iraniana, latina, grega, eslava, fenícia, etrusca,... Há também umha necessidade de explicar como antigos pictogramas, que descrevem os símbolos das letras (cuneiforme, padrom, geométrica ou outra) gradualmente formaram as novas letras modernas sistematizadas num alfabeto.

O grupo linguístico mais difundido hoje é a família indoeuropeia, que vai desde o hindi e persa para o norueguês e inglês. Por volta de 2000 a.d.n.e. os utentes indoeuropeus atravessaram toda a Europa até chegar às costa do Atlântico e Mediterrâneo, o planalto iraniano e partes da Índia.

A família línguística semítica foi muito relevante para a história da humanidade inicial e continua a ser hoje. Por volta de 3000 a.d.n.e. as línguas semitas espalharam-se entre os nômades que habitavam partes do deserto da Arábia, abrangendo a Síria, Babilônia, Assíria e a Fenícia. O aramaico era também umha língua semítica e foi considerada como a língua do Próximo Oriente. O grupo semita contém polo menos duas comunidades (Judeus e Árabes) que desempenharam um papel significativo na civilizaçom humana. O alfabeto árabe é generalizado entre as nações muçulmanas, nom apenas entre os de língua árabe.

Os alfabetos foram modificados ao longo do tempo, sendo necessárias novas letras para descrever novas palavras ligadas a operações militares, acordos comerciais ou denominações religiosas.


Outro grupo de línguas formou-se como resultado de modificações do latim, a língua dos antigos Romanos. O latim pertence à família indoeuropeia, mas nom é tam flexível quanto o grego antigo. No início falava-se em Roma, mas depois o latim tornou-se na língua oficial de todos os territórios conquistados. Até o século XIX os trabalhos científicos e filosóficos foram escritos principalmente em latim. Embora seja umha língua morta hoje, ainda é a língua oficial da Igreja Católica. A origem do alfabeto latino permanece a ser determinada. Acredita-se que se alicerçou no alfabeto grego, adotado e modificado polos Etruscos e adaptado polos Romanos. As línguas românicas foram criadas com base no alfabeto latino (italiano, francês, espanhol, português). As línguas germânicas, usando o alfabeto latino, levaram ao atual inglês, holandês, flamengo, alemão, sueco e islandês. O alfabeto latino foi modificado ao longo dos anos, a fim de satisfazer as necessidades fonéticas das línguas que o adotaram. Ao longo dos últimos 500 anos este alfabeto espalhou-se para outros continentes durante o período de colonizaçom. Em meados do século XIX os Romenos adotaram-no como alfabeto principal da sua língua nacional. Após a queda da URSS em 1991, alguns dos novos países que utilizam línguas túrquicas adotaram o alfabeto latino. Muitos manuscritos latinos redigidos por autores antigos e mais de 270.000 inscrições em latim permanecem preservadas até hoje.

As línguas aramaica, cananita e hebraica som semitas. Alguns dos livros bíblicos posteriores e do Talmude foram redigidos principalmente em aramaico antigo. No século VII a.d.n.e. a língua aramaica alastrou para outras nações da regiom e foi mesmo utilizada pola administraçom persa.

Para além do hebraico, o aramaico e grego som consideradas como línguas bíblicas, mas o Antigo Testamento foi escrito na língua hebraica sagrada. A língua dos rabinos (aramaico talmúdico) deriva dele e foi usada para a literatura talmúdica, contendo todas as tradições do judaísmo e é considerada como a primeira enciclopédia antiga.

A populaçom de Israel é linguística e culturalmente muito heterogénea. Estudos etnológicos de Israel sugerem que a comunidade que vive no território conta com 33 idiomas e dialetos. O hebraico tornou-se dominante novamente no final do século XIX com base na ideologia movimento sionista a forma de usá-la como umha língua comum moderna. Eliezer Ben-Yehuda e os seus seguidores criaram as primeiras escolas onde hebraico foi falado e ensinado, os livros também foram impressos em hebraico. De acordo com Ben-Yehuda, no período 1905-14, como resultado da imigraçom em massa, o hebraico tornou-se na língua dominante e quando, em 1948, Israel se tornou um Estado independente, foi proclamada como língua oficial, juntamente com o árabe. O esforço de Eliezer Ben-Yehuda teve um enorme impato sobre o desenvolvimento do hebraico. Ele escreveu vários volumes do dicionário contendo palavras hebraicas antigas e modernas para adaptar esta muito antiga língua com as necessidades e exigências modernas. O objetivo de Ben-Yehuda era desenvolver literatura hebraica em Israel, mas também respeitar as especificidades do hebraico religioso escrito. Esta ideia foi recebida com oposiçom por outros estudiosos que mantiveram que a língua nom se devia desviar dos textos sagrados da Torá e que nom devia ser adaptada para um uso de conversas diárias nas ruas. Há muitas línguas informais em Israel: iídiche (a língua dos Judeus asquenazitas na diáspora); o Ladino usado polos Judeus sefarditas com raízes espanholas; o Polaco; Ucraniano; Francês; os dialetos judeu-italianos; Húngaro, Turco e até mesmo Persa, Grego e outras.

O alfabeto original hebraico deriva do fenício, com base nos hieróglifos egípcios. Foi o sistema de escrita mais amplamente utilizado polos comerciantes fenícios em torno dos países do Mediterrâneo. O alfabeto aramaico (siriaco) também teve as suas origens no fenício e foi a base do alfabeto árabe moderno.

O hebraico é o meio de comunicaçom entre os Judeus, é a língua da religiom, é usada para a educaçom e a criaçom literária. Apesar de todas as migrações forçadas em tempos antigos e as perseguições durante o Holocausto, a língua manteve-se viva até hoje. De acordo com a Torá, as línguas semíticas existem como criações de D'us. O alfabeto hebraico nom é apenas umha coleçom de elementos linguísticos abstratos, cada letra tem o seu nome e identidade, e também têm valores numéricos. As letras tornaram-se marcadores da identidade judia e da religiom judaica, diferenciando diferentes nomes de D'us. Alguém pode dizer por que a primeira letra é Aleph e a segunda Beyt; todas estas perguntas provocam interesse justificado. Cada letra hebraica carrega um significado específico, por exemplo Aleph nom é apenas a primeira letra, mas também significa "boi" como boi sacrificial, Beyt está para casa, mas é também a letra de início da Torá (Bereshit, o início). Além disso, é a primeira letra de todas as bênçãos judaicas, como Baruch (abençoado), Baruch Hashem (abençoado por D'us). A letra Ayin significa olho, fonte ou centro, e cujo significado espiritual sugere o olho espiritual.

A língua hebraica carece do verbo auxiliar "ser" e as perguntas som colocadas com umha palavra pergunta ou apenas modificando a entonaçom do falante. Foi modificada por escribas, talmudistas e massoretas. Os especialistas em línguas antigas, como Ezra, Neemias ou os escribas da Grande Assembleia, o chamado Soferim, som conhecidos polos seus notáveis esforços. Os massoretas corrigiram com precisom os erros involuntários, contaram as letras e as palavras de cada livro e seus cuidados pedantes impediram qualquer outra cópia de erros. Os Soferim e Talmudistas tomaram muito cuidado com os delicados pergaminhos deteriorados por anos de uso, arrumando-os em genizah (quartos de arrecadaçom) das sinagogas ou mesmo enterraram-nos no chão como seres humanos. O hebraico dos Manuscritos do Mar Morto é a língua da Torá e representa um fenômeno marcante na cultura e história do Estado judeu. Apenas a tradicional oraçom em hebraico une mais de 14 milhões de Judeus em todo o mundo. Antigos nomes hebraicos como Jacobe, José, Sara e Miriam e palavras hebraicas antigas, como Amém, Aleluia, Shabat ou Messias foram adotadas por outras línguas sem ser traduzidas, por exemplo em corais de igrejas cristãs ou em orações muçulmanas.

Mendele Moycher Sforim (1836 -1917) foi o primeiro escritor moderno a combinar com seu estilo diferentes elementos do hebraico e iídiche. O seu trabalho contribuiu para a modificaçom do hebraico transformando-o numha língua literária moderna, contribuindo, destarte, para elevar o status da cultura judia.

Umha língua é um sistema de sinais para codificar e decodificar informações. Há umha diferença entre a língua e a fala. Enquanto a fala é o uso da língua, a língua em açom, a própria língua, como um sistema de regras, é a matéria-prima para a fala. As linguagens de programaçom som linguagens formais, que som usadas ​​polos computadores modernos para transmitir informações. A linguagem e pensamento estám ligados. A língua, sendo um meio de comunicaçom, é também um meio de troca de ideias. Quando duas pessoas se comunicam, esta é feita através da língua, que também representa as suas ideias, pois a lingua é um meio de representar os pensamentos. Outra característica da linguagem é a sua funçom estética como poesia. Encontra-se geralmente na fiçom e no folclore oral. O efeito estético é conseguido com a cuidado escolha das palavras, expressões e construções acaídas, enfatizando a dimensom estética. Infelizmente, a linguagem pode ser usada com a sua funçom manipuladora, ou seja, como propaganda, doutrinaçom e efeito negativo sobre os movimentos e valores religiosos. A manipulaçom da linguagem é usada dumha forma especulativa para criar a discriminaçom racial, a xenofobia e, especialmente, o antissemitismo, o que foi bem comprovado na política nazista.

Existem vários tipos de línguas (literária, nacional, regional, materna, estrangeira, infantil, jargom,...). Em consequência de acontecimentos históricos, alguns grupos humanos podem desaparecer ou ser assimilados, o que muitas vezes acarreta a perda da sua língua. Portanto, quando falarmos sobre a morte dumha língua, o que geralmente compreendemos é o seu desaparecimento, quer através dum extermínio ou absorçom violenta dum grupo humano, quer através dumha assimilaçom nom-violenta por outro grupo humano.

O professor August Schleicher é o autor dumha teoria da existência dumha protolíngua comum, que se teria transformado em diferentes línguas nacionais. Ele também lançou a ideia da árvore dumha família linguística.

Pensa-se geralmente que os livros som conhecimento e o conhecimento é poder. A humanidade teria sido espiritualmente mais elevada, se apenas os livros perdidos tivessem sido preservados. Os mitos sobre o conhecimento perdido e os livros nom lidos ilustra o nosso anseio pola espiritualidade. É mágoa imaginar que enquanto algumas pessoas estavam a recolher livros em bibliotecas, outros foram queimá-los. Perdeu-se a Grande Biblioteca de Alexandria, esse símbolo respeitado dos conhecimentos adquiridos na Antiguidade. Perderam-se os livros queimados polo imperador chinês Qin Shi Huang. Perderam-se os livros Sybilline, queimados no templo de Júpiter segundo a lenda. Perderam-se os livros pagãos, destruídos polo fanatismo cristão. Foram queimados os 5000 manuscritos árabes logo depois da conquista de Granada polo Cardeal Cisneros. Também foram queimados os livros de escritores judeus conhecidos por causa das queimas de livros nazistas.

Existe, com certeza, o mito da Torre de Babel recolhido na Torá para explicar a origem das diferentes línguas. De acordo com a história, umha humanidade unida das gerações após o Grande Dilúvio falava umha única língua. Em Babel eles concordaram em construir umha torre "de altura suficiente para alcançar o céu"; vendo isso, o Senhor confundiu as suas falas de modo que já nom podiam entender uns aos outros e espalhou-os por todo o mundo.


A importância fundamental das línguas foi confirmada em 2001, quando em 26 de setembro foi proclamado polo Conselho da Europa como o Dia Europeu das Línguas e desde entom tem sido organizado conjuntamente com a Uniom Europeia. Os estudos de línguas estrangeiras melhora nom só a comunicaçom entre as pessoas, mas também supera as barreiras intelectuais e as diferenças interculturais.

O termo hebraico "leshon hara" (má língua) é um termo utilizado para identificar o discurso depreciativo sobre outra pessoa e é considerado como um dos piores pecados. De acordo com o judaísmo é um dos pecados mortais, e se nom se arrepender, nom será admitido no Reino de D'us. "Leshon hara" difere de difamaçom em que se focaliza no uso dum discurso verdadeiro para um fim ilícito, em vez de falsidade e danos resultantes. Um discurso é considerado "leshon hara" se diz algo negativo sobre umha pessoa, nom é previamente conhecido do público, nom é seriamente destinado para corrigir ou melhorar umha situaçom negativa e é verdade. Falar dessa maneira é contra o mandamento da Torá de amar o próximo. Aqueles que expressarem ou escreverem cousas más muitas vezes nom som pessoas más, mas nom percebem que nom é a única falta que entra a boca, mas o que sai dela, como se viesse direta do coraçom. Como o filósofo alemão Lessing disse: "Saber que as árvores cortadas por um machado terá novos brotos que se tornarám novas árvores. A carne e os ossos feridos por umha espada curam novamente, mas umha ferida causada pola língua nom pode ser curada. A ponta dumha flecha mergulhada em más palavras atinge o coraçom e nom podem ser recuperados e deixa um buraco sangramento, como as más palavras nom podem ser esquecidas. A misericórdia nom nos ensina a esquecer o mal recebido, mas para evitar a raiva e sede de vingança".

Num arco-íris colorido feito de sons de oraçom, emergendo do sagrado "shofar", diversas línguas voam para o céu. No colorido e brilhante arco-íris, contodo, nom há lugar para a escuridom das palavras do mal. Este som do "shofar" tornou-se o meio de comunicaçom entre as diferentes nações, usando um ou outro alfabeto ou língua, uma forma de conectar as pessoas em nome da compreensom e da tolerância mútua.

"Tudo o que for feito com intervalos de raiva e palavras más, como os joios que dificultam a existência das plantas úteis, assim som as línguas; de forma que as pessoas devem dirigir os seus esforços para a erradicaçom destas ervas daninhas". (Passagem do Talmude)


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