segunda-feira, 5 de outubro de 2015

JUDEUS PORTUGUESES NO GOLFO DA GASCONHA

O País Basco do Norte (Iparralde) e a regiom occitana da Gasconha foram uns dos territórios de refúgio escolhidos polos Judeus e cristãos-novos portugueses entre os séculos XV e XVIII na procura de “terras de liberdade”, isto é, regiões nas quais a prática do judaísmo era tolerada ou permitida sem as inquirições e repressom inquisitorial. 

A fixaçom de comunidades judaicas nesses territórios viu-se favorecida por vários factores. Primeiramente, polo aumento da atividade repressiva da Inquisiçom no Reino de Espanha a partir de 1580, altura em que Portugal dependia de Espanha, e onde os estatutos de pureza de sangue proibiam o acesso a funções públicas aos descendentes de Judeus ou muçulmanos. Em segundo lugar, a posiçom geográfica destes territórios, fronteiriços com Espanha, possibilitava a saída dos cristãos-novos por mar ou polas rotas terrestres através dos Pirenéus.

Finalmente, as condições políticas nestes territórios refúgio permitiam certa liberdade e tolerância religiosa. Assim sendo, entre os séculos XV-XVI, as principais comunidades de judeus portugueses estabeleceram-se nos territórios pertencentes a duas unidades políticas: o Ducado da Guiena (integrado no Reino da França desde 1472) e o Reino de Navarra.

O Reino da Navarra foi um estado basco medieval fundado no século IX e que conservou a sua independência até a sua partilha no século XVI. Em 1512 a Alta Navarra é ocupada polo Reino de Aragom e integrada em 1516 no Reino de Espanha. A outra parte (territórios bascos de Baixa Navarra e Zuberoa e território gascom/occitano do Béarn) conservou a sua independência como Reino de Navarra até 1620. 

Durante o reinado de Joana III de Navarra (1555-72), a rainha converte-se em 1560 ao protestantismo. Apesar de decretar a liberdade religiosa no seu reino, a licença papal aos seus súbditos para a desobediência e a ocupaçom de qualquer um território governado por umha rainha excomungada como signo de obediência a Roma, tornaram impossível o convívio que finalizou com a imposiçom da religiom reformada (calvinista) e a proibiçom do catolicismo no Reino de Navarra em 1562. Despois das guerras de religiom, em 1589 o filho dela, Henrique III de Navarra, acede ao trono francês como Henrique IV, selando a paz entre católicos e protestantes.

O Ducado de Guiena foi um domínio hereditário da coroa da Inglaterra entre 1154-1453 que abrangia parte da Gasconha ocidental (zona de Bordéus e Dax) e Iparralde (área de Baiona). Despois do fim da Guerra dos Cem Anos foi integrado definitivamente no reino da França em 1472.

Em consequência, a chegada de refugiados judeus portugueses a esta zona foi auxiliada pola emissom das Cartas de naturalizaçom emitidas pelo rei Henrique II, em outubro de 1550. Essas cartas ficaram conhecidas como cartas patentes "respeitantes aos mercadores e outros portugueses chamados cristãos-novos" aos que som concedidos "todos os direitos e privilégios dos habitantes das cidades onde ficarem". De resto, em caso de expulsom, estas cartas patentes asseguravam um prazo dum ano, o que mostra o carácter eminentemente revogável desta legislaçom. Estas cartas foram confirmadas em 1574 e 1580.

Estas cartas patentes estavam redigidas nos seguintes termos: "Os reis sempre protegeram os comerciantes do reino e deram-lhes bons privilégios... O reino é abundante em trigo, vinho e outras riquezas... o que atrai os estrangeiros. A maneira de viver bem está aberta a todos aqueles que desejarem usar algum tipo. Quanto aos chamados Portugueses, chamados de cristãos-novos, foi desejo deles vir morar no nosso reino, e trazer as suas esposas e famílias e o seu dinheiro e móveis. [Entom o rei] compraz-se de dar-lhes cartas de naturalizaçom e gozar dos privilégios usufruídos por outros estrangeiros do reino. [Respondendo] liberalmente à súplica e procura dos chamados Portugueses, como pessoas às que vemos com bom zelo e carinho que eles têm de viver sob a nossa obediência, para trabalhar ao nosso serviço, para ajudar o reino dos seus bens, manufacturas e indústrias de sorte que isso nos move a tratá-los bem e graciosamente ".

Enquanto as principais comunidades judaicas estabelecidas na Gasconha foram Bordéus e Peira Horada, as fixadas no País Basco do Norte foram Donibane Lohizune, Biarritz, Saint-Sprit/Baiona, Bidache e Bastida.

À sua chegada os refugiados som denominados cristãos-novos que formam a naçom portuguesa. Na aparência cumprem rigorosamente todas as práticas da religiom católica, mas em casa permanecem leais ao judaísmo. 

Após a anexaçom definitiva do Reino de Navarra na França (1620), as cartas patentes foram confirmadas por Luis XIV (1656).


No início do século XVII os cristãos-novos portugueses suavizam a sua observância da religiom cristã, que abandonam completamente em meados de século, retornando abertamente ao judaísmo. Em seguida, som conhecidos como Judeus portugueses.

Em 1722 decretou-se que os Portugueses deviam ser contados e inventariados os seus bens com a proibiçom de os vender. Diante dessa ameaça os Judeus portugueses reagiram perante o rei Luis XV e conseguiram em 1723, através dum novo imposto de 110.000 libras, umhas novas cartas patentes respeitantes "aos Judeus ditos generalizados [de Bordeus e Auch] conhecidos e estabelecidos no nosso reino sob os títulos de Portugueses ou cristãos-novos...". Pola primeira vez os "mercadores portugueses" da França som oficialmente reconhecidos como Judeus. As cartas patentes foram confirmadas por Luis XVII em 1777.

Os Judeus portugueses formaram a comunidade judia mais florescente da França. As explorações agrícolas estám limitadas às vinhas que produzem o vinho casher. A índustria e sobretodo a transformaçom das provisões coloniais som especialidade dos Judeus. Os Gradis estám especializados no açúcar, os da Costa no chocolate, que foi introduzido na França polos Judeus portugueses de Baiona. Outros som principalmente médicos em Bastida.

Os judeus portugueses chegaram a Paris. Em 1780 é aberto um cemitério de judeus portugueses na rue de Flandre, o primeiro cemitério judaico em Paris desde a Idade Média.

Em 28 de janeiro de 1790 a Assembleia nacional reconhece a cidadania plena aos Judeus portugueses, generalizando-se esta medida aos Judeus chamados "alemães", isto é, asquenazitas. Desde entom produz-se umha emigraçom para Paris onde criam Sinagoga de Buffault.

Um membro desta comunidade, Pierre Mendès France, descendente da família judaico-portuguesa Mendes de França, foi presidente do Conselho de 1954-55.

Entre os Judeus portugueses franceses houve pessoas ilustradas, notamente o pintor Camille Pissarro, o financeiro Jules Mirès, o empreiteiro Moïse Millaud, o escritor Georges de Porto-Riche, Eugénie Foa, os poetas Bernard Delvaille, Catulle Mendès e os irmãos Pereire, o pedagogista David Lévi Alvarès, o ideólogo Olinde Rodrigues, os condes de Camondo, o mecenas Daniel Iffla Osiris, o médico Jean-Baptiste Silva,...


Judeus portugueses na Occitânia


Bordéus

A presença judaica está datada desde há vários séculos na metrópole da Gasconha. No século XVI esta comunidade é reforçada com a chegada de cristãos-novos portugueses e espanhóis.


Em consequência de motins antijudeus de 1574, o Parlamento local interdita de incomodar "os espanhóis e portugueses bons católicos". Nessa altura os Judeus beneficiam-se das cartas de naturalidade outorgadas por Henrique III.

Em 1604 e 1612 o tenente-general da Guiena emitiu umha ordenança proibindo às pessoas "falar mal ou danar os mercadores portugueses". 

A comunidade, fixada principalmente nas paróquias de St. Eulalie e St. Eloy, praticou o judaísmo na clandestinidade durante todo o século XVII. Nessa altura reclamaram o sepultamento nos cemitérios das duas paróquias, bem como nos pertencentes às paróquias de St. Projet e St. Michel, e nos cemitérios das ordens religiosas. Em 1710 umha parcela do cemitério católico foi reservada especialmente para os cristãos-novos. Os seus casamentos eram realizados por padres católicos , observando todas as formalidades rituais (mesmo a dispensa papal para os casos de consanguinidade).

Nos finais de seculo XVII produz-se a chegada a Burdéus dumha comunidade de Judeus procedentes de Avignon e Comtat-Venaissin que se declararam como tais mais abertamente.  No início do século XVIII os Judeus portugueses em Bordeus som 327 famílias (1.422 pessoas) enquanto os judeus de Avinhom contavam com 81 famílias (348 pessoas). Por razões de respeitabilidade e outras considerações, os judeus portugueses deliberadamente mantiveram-se afastados dos recém-chegados. 

Contudo, na altura de 1710 produz-se umha mudança de atitude da comunidade cristã-nova de Bordéus. Nom apenas era de conhecimento público que seus os moradores possuíam regulamentos e que na vida privada seguiam as leis mosaicas, os cristãos-novos começam a professar o judaismo mais publicamente. Enquanto os sacerdotes continuaram a registar os seus casamentos, eles geralmente acrescentavam umha nota para o efeito de que o casamento tinha sido ou devia ter sido realizado "de acordo com os ritos habituais da naçom portuguesa".

Em 1731, o administrador municipal opôs-se à regulamentaçom pola qual os "judeus portugueses" de Bordéus tinham que pagar o imposto de proteçom como os judeus de Metz. No entanto, em 1734 este funcionário lembrou aos Judeus de Bordéus que a prática da religiom judaica em público era proibida. Um relatório de 1753 menciona como um "escândalo" que a religiom judaica estava a ser praticada em sete sinagogas; na verdade, tratava-se de salas de oraçom em residências particulares.

O século XVIII foi de esplêndido crescimento para a comunidade. O comércio a escala internacional está em mãos dos Judeus portugueses, particularmente a família Gradis. As suas atividades incluem o comércio, a banca, o armamento de navios, os seguros, o tráfico de pessoas e o trânsito para as colónicas da América (mormente o Canadá francês).

Na altura da Revoluçom francesa (1789) os Judeus saem da clandestinidade e os seus membros participam das eleições para os Estados Gerais, obtendo representaçom, destacando-se como representante o cristão-novo lisboeta Abrão Furtado. Nessa altura em Bordéus residiam 2.400 Judeus.

Sob a iniciativa do Consistório Regional em 1809 é fundada a Grande Sinagoga de Bordéus cujo feitio está inspirado na arquitetura oriental. Nessa altura em Bordeus moravam 2.131 Judeus (77,5% de origem portuguesa, 6,8% de Avinhom e 15,8% procedentes da Alemanha, Polónia ou Holanda).

Durante o século XIX a populaçom judaica de Bordéus esmoreceu por causa da emigraçom, formando umha comunidade de 1.900 pessoas em 1940.

Durante a ocupaçom alemã a sinagoga, assaltada, é utilizada como local de concentraçom dos Judeus que nom conseguiram fugir a tempo. Cerca de 1.600 famílias som lá encadeadas antes de serem deportadas para os campos de Dachau e Auschwitz-Birkenau.

A comunidade de Judeus da naçom portuguesa de Bordeus floresceu durante vários séculos, fornecendo vultos na literatura, as artes (Nunés Pereyra, Péreire), o comércio (Gradis), a banca (Raba) e a politica (Mendes).

Na atualidade, a grande sinagoga, que se eleva numha ruela (R. do Grande Rabi Joseph Cohen) é um dos pulmões da comunidade judaica de Bordéus.


Pèira Horada/Peyrehorade

Nesta localidade fixou-se umha comunidade de cristãos-novos portugueses na altura de 1597. Sob o nome de "mercadores portugueses" formaram umha comunidade na altura de 1628, quando compraram umha quinta para albergar um cemitério.

Em 1648, quando foi decretada umha expulsom parcial, havia 42 famílias judaicas (por volta de 200 pessoas) na vila. No início do século XVIII a populaçom judaica era de 15 famílias. Posteriormente o número de Judeus aumentou, já que em 1747 a comunidade, publicamente conhecida como Judeus, comprou um segundo local para o cemitério.

Em 23 de maio de 1747 a comunidade judaica de Pèira Horada compra um prédio para fazer nele a sua sinagoga. A comunidade, muito organizada, contava cum talho próprio, um banho ritual (mikveh) e suportava até três sociedades dedicadas à actividades de caridade (Sedaca), enterramentos (Hebera) e estudo (Yesiba).

Os Judeus de Pèira Horada desempenhavam um papel ativo durante a Revoluçom francesa. Aquando a criaçom dos consistórios a comunidade inicialmente foi aderida a Bordeus e posteriormermente a Baiona.

Em 1826 foi comprado um terceiro cemitério, que também foi utilizado por Judeus das redondezas (em 1970 ainda existiam os três cemitérios).

A partir dessa altura os Judeus começaram a abandonar a vila. Em 1898 a vila compra a sinagoga ao consistório de Baiona, sendo derrubada em 1899 para abrir a rua da Sinagoga, entre a praça Aristide Briand e a rua Alsácia-Lorena. Posteriormente a sua mobília foi removida para as sinagogas de Biarritz e Baiona. No início da Segunda Guerra mundial ainda havia uns poucos Judeus a morar em Pèira Horada.


Toulouse

A comunidade de Tolosa (Toulouse) foi formada no século XVI por um grupo de portugueses e espanhóis que, conforme documentos notariais e paroquiais, eram suspeitos de judaizar. 

Para além dos cristãos-novos, também residiam na comunidade alguns Judeus declarados que lá permaneceram por um determinado período, pois o parlamento de Toulouse, no ano de 1653, promulgou um decreto determinando que todos os Judeus deveriam ser banidos da cidade, o que fez com que nos anos subsequentes muitos portugueses fugissem de lá, desintegrando tal comunidade. No entanto, em 1685 o Parlamento de Tolosa faz queimar 8 membros dumha comunidade cripto-judaica.

Os Judeus portugueses no País Basco Norte/Iparralde


Saint-Jean-de-Luz/Donibane Lohizune

Nom existe testemunha da presença judaica nesta cidade basca durante a Idade Média; foi apenas a partir do século XVI que se fixaram nela umha parcela de cristãos-novos conversos. De facto, inicialmente foi a cidade que abrigou a maior quantidade de refugiados. 

Em 1612 um funcionário encaminhou um relatório ao Conselho de Estado em que notificava a presença dumha importante colónia de cristãos-novos. As famílias que lá residiam tinham alegadamente relações com famílias de Paris, Amsterdã e de outros lugares.

Essa comunidade desfragmentou-se devido a um acontecimento ocorrido no ano de 1619 na igreja de Saint-Jean-de-Luz. Quando o padre percebeu que a portuguesa Catherine de Fernandes, umha mulher recentemente vinda de Portugal, enbrulhara a hóstia num pano ao invés de degustá-la, houve umha revolta popular e Catherine de Fernandes acabou sendo queimada viva polos populares. Ao mesmo tempo, um padre de origem portuguesa foi também acusado de ser cripto-judeu que fora escolhido como crego por um grande número de cristãos-novos que, de facto, se comportavam mais como Judeus que como cristãos.

Com isso, os demais cristãos-novos que lá residiam foram expulsos de Saint-Jean, refugiando-se em Biarritz e em seguida em Baiona


Biarritz

A comunidade judaica de Biarritz é datada de inícios do século XVII quando em 1619, depois duns tumultos antijudaicos em Saint Jean-de-Luz, por volta de 2.000 cristãos-novos abandonaram essa povoaçom para fixar-se em Biarritz.

No recenseamento de Judeus realizado em 1942 havia 168 famílias judias.

A sinagoga de Biarritz, construída em 1904, contém um candelabro prateado proveniente da antiga sinagoga de Pèira Horada.

Em 1968 a comunidade local tinha 150 membros, muitos deles procedentes da África do Norte.



Saint-Esprit/Baiona

Em meados do século XVI instala-se, a partir de refugiados vindos de Portugal e do Reino de Navarra, umha comunidade judaica em Saint-Esprit-lès-Bayonne, nessa altura município a norte de Baiona e separado da cidade polo rio Adour. Em 1597 a comunidade alarga-se logo depois da expulsom de Bordéus dos cristãos-novos que não tivessem dez anos de residência no local.
Vista do porto de Baiona de Saint-Esprit
Até o início do século XVII o desenvolvimento e prosperidade dessa comunidade é de completa penúria, sobrevivendo muitos membros ao abrigo da caridade local ou da ajuda enviada por membros de comunidades da Inglaterra e Holanda. De facto, apesar de serem polas autoridades, os mercadores locais excluiram os Judeus portugueses de participar no mercado ao retalho.

Mas os Judeus defendem-se e em 1632 um emissário da inquisiçom espanhola em Baiona é arrestado e encadeado acusado de espiom espanhol. Em 1636 algumhas famílias de cristãos-novos foram expulsas, refugiando-se em Nantes (Bretanha). Nessa altura a populaçom da comunidade judaica em Saint-Esprit é de 60 famílias.


A grande maioria de membros observa secretamente as suas crenças, já que o judaismo era proibido na França desde o século XIV. Viviam como criptojudeus, entretanto, nom buscavam esconder essa situaçom, umha vez que, mesmo discretamente celebravam as festas judaicas, recebiam instruções em escolas judaicas informais e frequentavam as diversas esnogas domésticas habilitadas. Apenas a partir de meados do século XVII é que a comunidade de Saint Esprit organiza umha congregaçom sob o nome de Nefusot Yehudad (Dispersom de Judá).  A comunidade de Baiona tinha jurisdiçom sobre as comunidades de Bidache, Pèira Horada e Labastida.

Em 1689 é aberto o cemitério judaico na área de Saint-Etienne, a norte da vila, sendo alargado nos séculos XVIII e XIX. Em 1862 foi construído um depósito de cadáveres em forma de templo antigo. Este cemitério abriga numerosas lápides do século XVII.

Fonte: Victor Guerra
Cemitério judaico de Baiona (Iparralde - Euskal Herria)
A prosperidade econômica de Baiona desata-se a partir de 1615 com a o desenvolvimento da indústria do chocolate. Com certeza, a judiaria de Baiona contribui para introduzir o chocolate na França e tornam a Baiona na capital do chocolate, sendo conhecida ainda hoje pola sua qualidade.


Em 1723 ocorreu um salto gigantesco no seu estatuto, tanto económico como social, pois é reconhecido o direito a observar publicamente o judaismo ao abrigo da carta patente outorgada por Luis XV. Nesse momento, foram abertas mais de treze sinagogas, contrataram-se rabinos de Amsterdão, e foi construído um cemitério e, em 1752, é editado o regulamento da nação judaica, regulamento este que foi confirmado polo rei.

A troca de correspondências com o judaísmo rabínico de Amsterdão deu-se como umha forma de buscar o conhecimento da religiom dos seus ancestrais, pois, devido ao longo período de conversom forçada na península Ibérica, em que o contato com o  judaísmo se deu quase que exclusivamente pola tradiçom oral fazendo com que o conhecimento do judaísmo oficial se fosse perdendo aos poucos. Os conhecimentos sobre a fé judaica que estes cristãos-novos portugueses de Baiona ainda conservavam eram dispersos e soltos. 

O factor decisivo no modo de vida desses portugueses de Baiona foi a relativa liberdade existente na França, pois mesmo o judaísmo sendo proibido, nom havia lá o rigor da Inquisiçom, o que permitiu aos membros dessa comunidade umha liberdade ao menos parcial o que permitira até entom a abertura tanto de esnogas, como escolas informais ou cemitérios. 


Assim sendo, durante a primeira metade do século XVIII a populaçom judaica de Saint-Esprit aumenta consideravelmente, passando de 700 para 3.500 pessoas em 1753, o que representa os 3/4 da populaçom do bairro e mais dumha quarta parte da aglomeraçom de Baiona. 

De resto, pola sua localizaçom, nom cessou a chegada de cristãos-novos vindos de Espanha e Portugal onde ainda operava a inquisiçom. De facto, Baiona é o local em que se estabelece umha etapa a ser transposta polos cristãos-novos que fogem dos reinos ibéricos e também favorece o estabelecimento de relações com os que ficaram na península.


No final do século XVIII a comunidade de Judeus portugueses de Baiona torna-se numha pequena metrópole. O que propiciou esse desenvolvimento foi a localizaçom geográfica privilegiada, pois o acesso, tanto por via marítima quanto terrestre, fez da comunidade um porto para intercâmbio cultural, social e comercial com as demais comunidades da diáspora sefardita.

Os Judeus portugueses de Baiona eram muito ativos no comércio internacional, principalmente com os países de fixaçom doutras comunidades judaicas de origem espanhola ou portuguesa. Entre outros, o comércio é florescente com as Caraíbas, as Antilhas neerlandesas, Amsterdão ou Londres. Aliás, muitos mercadores portugueses, chamados de "retornados habituais", iam e vinham dos reinos de Espanha para fazer negócios. De resto, Baiona servia de local de passagem para os que buscavam as terras de liberdade religiosa, como por exemplo, Amsterdão.

Em geral, os portugueses habitantes eram pequenos negociantes e controlavam as importações de cacau, o sal e da cola, o que permitiu que fossem dos primeiros a estabelecer ligações comerciais com as Índicas Ocidentais francesas. Prova do seu peso económico é até um terço dos ingressos fiscais municipais procedia dos residentes judeus.

No entanto, nos finais do século XVIII a populaçom judia experimenta umha queda. Em 1785 formam umha comunidade de 2.500 pessoas, o que representa metade da populaçom de Saint-Esprit. Embora em 1787 se permite que os Judeus possam morar em Baiona e comprar bens nesa cidade, a maioria continua a residir em Saint-Esprit.


Apesar da oposiçom da vizinhança católica, os Judeus de Baiona participaram nas eleições aos Estados Gerais de 1789. Juntamente com o resto de Judeus "portugueses, espanhóis e avinhonenses" som reconhecidos como cidadãos franceses em 1790.

Durante a Revoluçom as sinagogas de Bidache e de Labastida som encerradas e os Judeus destas duas vilas estabelecem-se em Peira Horada ou em Saint-Esprit. Nesta última vila, o rabi Andrade acocha num alpendre os textos religiosos e diferentes objetos de culto antigos substituindo-os por outros objetos sem valor que serám queimados polos revolucionários. Durante o período do Terror a maioria de membros do Comité de vigilância de Saint-Esprit (entom conhecido como Jean Jacques Rousseau) eram Judeus e nom houve qualquer vítima da guilhotina. 

Durante o período napoleónico a comunidade judaica beneficiou-se do incremento de prosperidade da cidade desenvolvendo atividades como farmaceuticos, armadores ou mercadores que se integram na populaçom local.

Em 1837 foi construída a esnoga de Baiona. Porém, entre o século XIX e o XX a populaçom judaica nom deixou de cair, passando de 1.293 pessoas em 1844 para 45 famílias em 1926.

Na véspera da Segunda Guerra mundial a comunidade judia está formada por 1.000 pessoas. Após o armistício franco-alemão (junho de 1940) Baiona tornou-se numha paragem para dezenas de refugiados judeus, particularmente da Bélgica e Luxemburgo. Como um grande número nom pude chegar a Espanha, o censo oficial da polícia de 15 de março de 1942 registrou 308 famílias judias. O rabi de Baiona, Ernest Ginsburger (1876–1943) dirigiu as atividades religiosas dos Judeus internados nos campos de concentraçom e de trabalho franceses. Ele foi posteriormente deportado e abatido polos alemãos juntamente com 60 membros da comunidade.

Em abril de 1943, quase todos os Judeus de Baiona e das redondezas foram evacuados à força, enquanto as propriedades judaicas eram confiscadas. Por ventura, a arca, com feitio ao jeito de Luis XVI e os escritos antigos foram ocultado no Museu Basco e devoltos à sinagoga após a Libertaçom. Poucos Judeus de Baiona sobreviveram à guerra e em 1945, a comunidade está formada por 240 membros. 

René Cassin, o ganhador do Prémio Nobel da Paz em 1968 polo seu trabalho na elaboraçom da Declaraçom Universal dos Direitos Humanos adoptada pola Assembleia Geral da ONU em 1948, nasceu em Baiona em 1887. Ele também foi Presidente do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (1965-68) e presidente da Aliança Israelita Universal, nasceu em Baiona em 1887.

O decrescimento populacional desacelera-se na década de 1960 com a chegada dos Judeus da África do Norte, conformando umha comunidade de 700 pessoas em 1969. A sinagoga foi restaurada e os serviços religiosos foram desempenhados por um rabi consoante os antigos ritos sefarditas-portugueses da velha esnoga. Aliás, restaurou-se o uso do cemitério.

Atualmente a comunidade judaica de Baiona-Dax-Hendaia está formada por 200 famílias espalhadas.

O Museu Basco conserva duas salas que disponibilizam umha grande quantidade de objetos religiosos judaicos e documentos históricos respeitantes da comunidade judaica de Baiona.


Bidache

Comunidade de Judeus portugueses estabelecida no início do século XVII a partir da comunidade existente de Baiona sob a proteçom do Duque de Gramont através dos estatutos de 1665 e 1668.

Na segunda metade do século XVII um prédio da rua Principale de Bidache foi transformado para abrigar a sinagoga da comuniade judaica. A porta fronteira estava encimada por um conjunto provavelmente vandalizado durante a Revoluçom francesa. Segundo o historiador Gérard Nahon os emblemas martelados poderiam ser as iniciais do nome hebraico dado à comunidade judaica de Bidache na literatura rabínica dos séculos XVII e XVIII (Casa da Paz). O prédio, agora chamado de Capdevielle, foi redesenhado no terceiro quartil do século XX, perdendo a porta de madeira cravejada.

Prédio da Sinagoga de Bidache. Wikipedia
Quando, no início do século XVIII, a autoridade distrital de Auch desejava realizar taxaçom geral sobre os Judeus portugueses na área, o duque de Gramont interveio em nome dos judeus em Bidache, incluindo que todos os Judeus, independente da sua origem,  "desfrutam do privilégio de nom tributaçom".


A comunidade judaica espalhou-se após a Revoluçom francesa e nunca foi restabelecida. 

Em 1665 os senhores de Gramont autorizam a abertura dum cemitério aos Judeus "dits Portugais", localizando-se na Port Road nas redondezas da vila. O cemitério, que contém umha centena de lápides com epitáfios em hebraico e português, foi utilizado desde a segunda metade do século XVII até a segunda metade do XVIII.


Cemitério judaico de Bidache. Wikipedia
Existiu um segundo cemitério judaico cujas inscrições mostram que foi utilizado entre o terceiro quartil do século XVII e o quarto quartil do XVIII.

Bastida/Labastide-Clairence

Comunidade judaica formada no início do século XVII a partir de Judeus portugueses chegados a Baiona.

Conhecidos como "portugueses", em Bastida fixaram-se entre 70-80 famílias hebraicas sob a proteçom dos duques de Gramont, em posse do direito de justiça, e que mantiveram ligações com a comunidade de Amsterdám.

Lá viveram numha comunidade relativamente autónoma designada pola expressom de "naçom judia" nos registos do Corps de Ville e contaram com um cemitério distinto do cemitério cristão que foi aberto logo depois da sua chegada. De facto, talvez se trate do primeiro cemitério adquirido polos Judeus portugueses na França (o primeiro túmulo é de 1620).


Cemitério judaico de Bastida. Wikipedia
Embora numha primeira altura foi um cemitério de cristãos-novos, a partir de 1659 torna-se num cemitério judaico (nomes judaicos gravados nas lápides e dataçom judaica). Abandonado nos finais do século XVIII, o cemitério foi profanado polos alemães em 1941.

As inscrições gravuradas nos túmulos (62) foram reveladas entre 1962-64 polo professor Gérard Nahon. Enquanto a campa mais antiga data de 1620, a mais recente é de 1785. Em 18 a data da morte está escrita no calendário hebraico. A partir de 1659 todos os nomes som bíblicos (Jacob, Isaac, Benjamin, Esther, Sarah, Rebecca). Entre os apelidos figuram Dacosta, Henriquez, Lopez, Nunez, Depas, Alvares.

A partir do século XVIII a importância da comunidade judaica diminui em consequência do declínio de Bastida. Desde meados de século até 1798 o número de famílias passa de 15 para 6. Aproveitando as novas liberdades concedidas pola Revoluçom francesa os Judeus abandonam a vila, esmorecendo a comunidades.

O cemitério judaico pertence ao Consistório israelita de Baiona.

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