quinta-feira, 27 de junho de 2013

ESQUERDA JUDIA: DO ILUMINISMO À REVOLUÇOM RUSSA (II)

Iluminismo e emancipaçom

A esquerda judia tem as suas raízes filosóficas no Iluminismo Judaico, ou Haskalá, movimento liderado por pensadores como Moses Mendelsohn, bem como o apoio de muitos judeus europeus, como Ludwig Börne, aos ideais republicanos na sequência da Revoluçom Francesa e as guerras napoleônicas. Nos séculos XVIII e XIX alastrou por toda Europa um movimento para a emancipaçom dos judeus fortemente associado com o surgimento do liberalismo político, alicerçado nos princípios iluministas dos direitos e da igualdade perante a lei. Muitos dos precursores do socialismo moderno (Saint-Simon ou Robert Owen) defenderam a igualdade dos judeus, considerando a emancipaçom dos Judeus como umha das pré-condições para a libertaçom da humanidade.

Admitidos nas sociedades burguesas da Europa ocidental, os judeus emancipam-se crescentemente da antiga condiçom de povo-classe, rompem co o mundo do gueto e integram-se na moderna economia de mercado. Já que nessa altura os liberais representavam a esquerda política, os judeus emancipados, enquanto entraram na cultura política dos países onde moravam, tornaram-se muito associados com partidos liberais. Assim, muitos judeus apoiaram a Revoluçom Americana de 1776, a Revoluçom Francesa de 1789 e as revoluções europeias de 1848.

Jean Czynsky, um refugiado polaco na Inglaterra de origem judaica escreveu que a liberdade para a Polónia e a emancipaçom dos judeus polacos eram conceitos polos que deviam lutar todos os socialistas. Em março 1871 os judeus desempenham também um papel proeminente no levante operário da Comuna de Paris.


Em 1896 um militar francês de origem judaica, Alfred Dreyfus, vê-se injustamente acusado como espiom do Império alemão. Ainda que extremadamente assimilado, a origem judaica dele foi utilizada polos círculos reacionários antirrepublicanos e claricais franceses como referência no seu julgamento. Destarte, o rumoroso caso serviu para que esses grupos reocupassem espaços que pretendiam seus na política francesa. 

O mundo judeu viu-se profundamente abalado polo impacto da propaganda e das manifestações antissemitas decorrentes do processo do Caso Dreyfus.


O surgimento dumha classe trabalhadora judaica

Na Europa Oriental, pola sua vez, o antissemitismo era um elemento constitutivo das culturas eslavas. O Império russo dos czares realizava pogroms, ataques organizados desde o poder contra a minoria judaica nos quais eram cometidas toda sorte de violências. Levadas a cabo por autênticos bandidos e desqualificados sociais, os pogroms constituiam-se umha importante válvula de escape à opressom sofrida polo povo no regime czarista que, assim, encontrou umha forma de desviar as atenções da classe trabalhadora para um alvo que nom afetasse o status quo.

Na era da industrializaçom no final do século XIX surgiu umha classe trabalhadora judaica nas cidades da Europa Central e Oriental, mormente na Rússia, Bielorrúsia, Polónia, Ucrânia e Lituânia.

Em 1897 também surgiu um movimento operário judeu, Federaçom Geral de Operários Judeus da Rússia, Polônia e Lituânia ou BUND Judeu, constituido em Vilna, Lituânia. Constituiu-se no primeiro partido marxista da Rússia, o primeiro a desafiar as trevas do czarismo e o mais importante elemento de divulgaçom do socialismo entre o proletariado judeu. Membro fundador do Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR), chegou a representar um terço da sua militância.

Diversas organizações anarquistas e socialistas judias formaram-se e espalharam-se pola zona de Assentamento Judeu do Império Russo (Pale).

Houve também um número significativo de pessoas de origem judia e que nom se identificavam explicitamente como judias, mas que foram muito ativas nas organizações, movimentos e partidos de tipo anarquista, socialista e social-democrata e comunistas.

Todas estas forças democráticas e socialistas combateram a manipulaçom ideológica antissemita do czarismo.

Consoante o sionismo cresceu como movimento político, formaram-se partidos sionistas marxistas socialistas, como o Poalei Sion de de Ber Borochov. Houve formas de esquerda nom sionista do nacionalismo judeu, tais como o territorialismo (que exigia um lar nacional judeu, mas nom necessariamente na Palestina), o autonomismo (que exigia direitos nacionais nom-territoriais para os judeus em impérios multinacionais) e o folkismo de Simon Dubnow  (que defendia a cultura judaica das massas de língua iídiche).

Consoante os judeus do Leste Europeu emigraram para Ocidente (principalmente para os EUA) a partir da década de 1880, essas ideologias enraizaram nas crescentes comunidades judias, como a do East End de Londres, o Pletzl de Paris, a de Lower East Side de Nova Iorque ou em Buenos Aires.

Houve um ativo movimento anarquista judeu em Londres cuja figura central foi, paradoxalmente, o pensador e escritor alemão nom-judeu Rudolf Rocker.

O importante movimento socialista judeu nos Estados Unidos, com o seu diário em língua iídiche (The Forward) e sindicatos como a Uniom Internacional de Trabalhadoras de peças de Vestuário (ILGWU) ou as Trabalhadoras Amalgamadas de Roupa da América (ACW). Figuras importantes nestes movimentos incluíam Rose Schneiderman, Abraham Cahan, Morris Winchevsky e David Dubinsky.

No final do século XIX e início do XX, período da II Internacional, os judeus desempenharam um papel importante nos partidos social-democratas da Alemanha, Rússia, Áustria-Hungria e Polônia.

Na Alemanha, onde o SPD era a mais forte das organizações socialistas europeias, em 1912 havia 12 judeus entre os 100 deputados social-democratas no Parlamento alemão. Nas condições após a Primeira Guerra mundial, socialistas judeus ocuparam postos de governo nos ministérios socialistas da Alemanha, Áustria, Hungria e Rússia.

O historiador Enzo Traverso usou o termo "judaico-marxismo" para descrever as formas inovadoras de marxismo associadas a estes socialistas judeus, cujas posições variavam dum forte cosmopolitismo hostil a todas as formas de nacionalismo (caso da Rosa Luxemburgo e, em menor medida, de Leon Trotsky) para posições mais próximas do nacionalismo cultural (como acontece com os austromarxistas ou os bundistas de Vladimir Medem).



É provável que a maioria destas figuras nom se considerassem parte explícita dumha esquerda judia, mas é relevante o número significativo de pessoas de cultura judaica que foram ativos nestes partidos e movimentos.

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