quarta-feira, 29 de maio de 2013

O RESGATE BASCO

O papel dos exilados bascos na emigraçom clandestina judia cara Palestina


As relações e contactos entre o nacionalismo basco e o sionismo som antigas. Existem muitas semelhanças entre os dous povos: língua própria, carácter étnico, umha simbologia, umha longa história, umha profunda identidade nacional e, acima de todo, umha situaçom de opressom e marginalizaçom.

Durante a ocupaçom nazista da França a Resistência Basca, através dos seus contatos, os chefes de cadeia de passagens fronteiriças e em relaçom com os aliados, consegue passar pola muga (fronteira) muitos judeus. Mesmo som realizadas operações de resgate, como a realizada no campo de concentraçom de Gurs que permite a libertaçom dalguns hebreus lá detidos através dum túnel subterrâneo escavado por bascos do exterior.

Depois da Segunda Guerra mundial, Venia Hadari, agente do Mossad Aliya Bet, o organismo encargado de organizar a emigraçom clandestina dos refugiados judeus desde a Europa para a Palestina, recruta o capitám da Marinha Mercante Rafael Inda, de Las Arenas. Esta contrataçom tem o visto bom do Governo Basco no exilo sediado em Paris, através de Javier de Gortázar. Realizam-se através da Sociedad Ginesta, que durante a guerra civil serviu como fachada da rede de apoio à República espanhola e que agora se iria tornar num pano para a atividade do Mossad.

Rafael Inda, oficial da armada republicana durante a guerra, saiu dum campo de concentraçom (de “accueil”) francês em Bizerta para mandar um barco que transportava muniçom para o Afrika Korps desde o Pireu. Em Marselha entra em contato com Víctor Gangoitia, um antigo oficial da ANV e   entre 1947-53 subdelegado do Governo Basco para assuntos de refugiados.  Víctor Gangoitia aceitou a proposta porque “nessa altura tínhamos muitas cousas em comum com o povo judeu: éramos comunidades perseguidas que combatiam pola identidade nacional”.  

Pola sua vez, o representante do governo basco contatou com outros fugidos do regime franquista, entre os quais, Hilario Erkiaga (gudari antes de formar-se o Euzko Gudarostea, que fugira para a França e trinado em Paris pola OSS após aderir-se ao Batalhom Gernika), Hilario Zarragoitia (cozinheiro de barco que, após fugir dum campo de concentraçom em Prat de Mollés e ser internado polos franceses em Argelès sur Mer acabara num campo nazista em Fecamp, no Canal da Mancha), Santi Zumaran (marinho que fizera parte da tripulaçom do “Vita”, o iate que levou fundos da República espanhola para México), Mariano de Lekeito (que já transportara anteriormente judeus para a Palestina), Alejandro Coto (ajudante de máquinas de Algorta exilado em Marselha), um Txomin de Bermeo, e Esteban Zubiaga Ernandorena (capitán comunista). No total, até 26 marinhos bascos deviam fazer parte da tripulaçom dos navios que levariam os refugiados judeus.

Esteban Ernandorena (Captain Steve)
A Agência Judaica queria repetir o golpe de efeito como o produzido com o navio “Exodus” no verão de 1947 e para isso alvejou levar quase 16.000 sobreviventes do Holocausto (na sua maioria refugiados da Roménia) para o porto de Haifa. Os navios eram o Pan York e o Pan Crescent, dous grandes navios de 470 toneladas comprados polo Haganah e o Mossad em Nova Iorque à UFCo para esse fim.  

O "Pan Crescent" e o "Pan York" sairam para o Mediterrâneo em maio de 1947 com umha tripulaçom professional americana. Cada navio estava preparado para levar 7.000 refugiados (Ma'apilim). 

Com esse fim, o Pan York, que seria tripulado por bascos, foi enviado para Marselha. Enquanto Esteban Ernandorena foi o primeiro imediato deste navio, o capitám Inda foi requerido polo Mossad para pilotar um motoveleiro com refugiados que encalhou em Haifa. Completavam a chefia da  tripulaçom Gad Hilb como capitám e os oficiais Efraim Tzuk como engenheiro chefe e Werner Salomon. O resto da tripulaçom estava composto polo grupo referido  de seis exilados bascos contatados, sete judeus americanos voluntários e tres homens do Mossad Aliá Bet e 7 do Palmach.




O Pan Crescent, foi enviado para Veneza, na Itália e a sua tripulaçom americana foi substituída por umha equipa italiana.




Já que os navios nom estavam prontos para acolher pessoas, era preciso realizar trabalhos para preparar os porões e o seu acabamento interior (catres, casas de banho,...). Umha vez arranjados, os navios deviam partir rumo para o porto de Constanza, na Roménia, país com o qual a Agência Judaica chegara a um acordo para facilitar a saída dos refugiados judeus. 

Porém, a pressom britânica sobre a França e a Itália forçou o abandono dos portos de Marselha e Veneza antes de os trabalhos de condicionamento estarem finalizados. O Pan York aportou em Constanza nos finais de agosto, atrasando-se um mês a chegada do Pan Crescent por causa dumha sabotagen dos serviços secretos britânicos, que queriam evitar que os navios chegassem ao Mar Negro.

Os britânicos colocaram os navios sob observaçom desde que entraram no Mediterrâneo. Eles estavam cientes do propósito da operaçom e exerceram umha forte pressom pressionaram os americanos para que usassem a sua influência sobre os governos dos EUA e a Roménia. Na sua desesperaçom chegaram a alegar que "toda umha brigada de bolchevistas estava a ser levara para a Palestina".

Como o governo americano era da opiniom de que a Yishuv na Palestina nom tinha a menor oportunidade contra os árabes, também disponibilizou-se a ajudar os britânicos a limitar a Aliya. Assim semdo, os norte-americanos colocou  umha tremenda pressom sobre Moshe Sharet, chefe da Agência Judaica, e outros dirigentes da Yishuv para que suspendessem a partida dos dous navios para a Palestina, com o argumento de que prejudicaria os esforços para implementar a resoluçom da ONU de 29 de novembro da Partiçom da Palestina. Sharet aceitou os argumentos dos EUA e visou parar a saída da embarcações, solicitnado que Ben Gurion desse a ordem. Ben Gurion tendia a concordar com a visom da situaçom de Sharet da situação mas, antes de chegar a umha decisom, Shaul Avigur -o chefe do Mossad Aliya Bet-, deslocou-se para a Palestina em 9 de dezembro para tentar dissuadi-los de travar a operaçom. Ele retorquiu que havia milhares de sobreviventes que ficaram sem abrigo ou roupas para o inverno, e um atraso na sua chegada à Palestina seria uma catástrofe para eles. Em consequência, Ben Gurion mudou de ideia. Na sequência destas pressões a Roménia recua o seu acordo para permitir a saída dos navios de Constanza. 

Logo a seguir umha equipa encabeçada por Yankale Salomon, antigo Comandante do 4º Batalhom do Palmach, organizou os comboios que levaram 15.200 sobreviventes do Holocausto de toda a Roménia para o porto de Burgas, na Bulgária.

Segundo Alejandro Coto, ao recolher a “carga” no porto búlgaro “havia umha multidom. Todos eles levavam às costas o pouco que lhes restava. Lembro perfeitamente que a maioria tinha as suas cousas dentro de lençóis atados polas pontas”. Nom suspeitavam que todo ia ficar lá. “Os da Agência Judaica foram muito duros com isso, obrigando-os a abandonar todo no cais porque apenas podíamos levar pessoas. Nom podem imaginar as cenas dramáticas que vivemos lá, como choravam; deviam deixar os seus pertences, toda a sua vida, atrás. E depois, havia alguns que estavam em condições precárias, muito fracos, mal podiam subir sozinhos pola passagem, assim que tínhamos de ajudá-los... Aquilo foi muito duro, muito duro”.

O Pan York e Pan Crescent  sairam do porto de Burgas em 26 de dezembro levando  7.557 e 7.612 passageiros, respetivamente. Havia mais de mil crianças menores de cinco anos, 4.000 crianças de máis idade sozinhas e 6.000 jovens. Umha equipa de 55 médicos estava na lista de passageiros, nascendo seis bebés no caminho. 

No caminho, à saída do estreito de Dardanelos, foram interceptados e bloqueados por três fragatas britânicas. De súbito, o buque escora perigosamente: “Nom havia mau mar, nom sabíamos o que se passava, -disse A. Coto-. Quando subimos a coberta ficamos assombrados: os judeus estavam todos do lado por onde apareceram os britânicos, insultando-os e ameaçando-os com os punhos para que nos deixassem passar”. 

Alcançou-se um acordo com os britânicos, a teor do qual os dous navios iriam diretamente para o Chipre. As tripulações dos dous navios nom seriam presas e o capitão de cada navio, Gad Hilb e Ike, iriam continuar a atendê-los com a ajuda de uma pequena equipa enquanto eles permaneceram ancorados perto de Famagusta. 

Durante a travessia segundo A. Coto “os passageiros saiam à cobertura para tomar o sol de inverno e respirar, fugindo da superlotaçom. Alguns pediam-nos que lhes deixássemos os chuveiros, mas era proibido porque eram milhares de pessoas, um problema real.  Nós dissemos: Olhe, eis a porta, eu nom vi nada”. 

Em 31 de dezembro os dous navios aportam no Chipre.

Os judeus ficaram confinados num campo de refugiados de Famagusta, onde estiveram até que meses mais tarde foram trasladados para o Estado de Israel. Relativamente à tripulaçom, os responsáveis dos barcos foram retidos (no caso de Hilario Erkiaga era o quarto campo em que entrava) até que puderam escapar utilizando nomes falsos. Os bascos, prisioneiros dos britânicos, entregaram os seus salvo-condutos franceses para poder serem usados na emigraçom clandestina.

Em 15 de maio de 1948 é proclamado o Estado de Israel, incorporando-se Ernandorena e Gangoitia ao ZIM (a Marinha Mercante Israelita). Os outros regressaram à França e outros, como Hilario Erkiaga, exilaram-se na Venezuela.

Com efeito, Vítor Gangoitia decide ficar de vez em Israel, fazendo parte desde 1948 até 1959 da ZIM . Lá conhece a sua mulher e nasce umha das suas duas filhas. Anos depois ele conta a sua participaçom no Resgate basco nos seguintes termos: "Eu sou basco. O meu nome completo é Víctor Gangoitia Zurzanazavalazagoitia e sou um republicano espanhol. Quando perdemos a guerra e Franco dominou toda Espanha com a ajuda dos vizinhos nazis e fascistas, abandonei o meu país num barco com bandeira panamense que fora alugado pola Agência Judaica. Durante três anos passamos pioneiros para Palestina sem ninguém dar conta. Ainda estava sob o Mandato Britânico e o nosso navio tinha que viajar durante a noite para evitar o seu bloqueio. Isso, até que fomos apanhados e toda a tripulaçom juntamente com os imigrantes "ilegais" fomos enviados para um campo de concentraçom na Turquia". 

O capitám Esteban Ernandorena Ernandura, mais conhecido de “Captain Steve”, instala-se em 1948 em Haifa com a sua mulher e os seus quatro filhos, obtendo toda a família a cidadania israelita. Amigo de Walter Eytan, o “Captain Steve” tornou-se num dos membros mais importantes da ZIM. Depois da sua morte em 1965 umha placa na sua lembrança e homenagem na parede da casa dos marinheiros de Haifa diz (em hebraico e inglês): “1905-1965, nascido em Biscaia; capitám de mar, ativo na frota “ilegal”; um dos cofundadores da Marinha Mercante Israelita, residente em Haifa”. Nessa cidade vivem ainda hoje alguns dos seus descendentes com apelido euskaldun e no seu cemitério o “Captain Steve” está soterrado junto da sua mulher.


Alejandro Coto passou um mês no Chipre à espera de arranjas os impressos e regressou a Marselha, partindo para novas aventuras que o levaram a Austrália e Singapura.

O Pan York e o Pan Crescent, rebatizados como Kibbutz Galuyot e Atzmaut, respetivamente, realizaram posteriormente mais viagens como a descrita, deslocando a maioria dos refugiados dos campos de concentraçom do Chipre para o novo Estado de Israel.

O Pan York aportando em Haifa

Durante a operaçom Aliá Bet, coordenada polo Mossad Aliá Bet, 120 barcos realizaram até 142 viagens clandestinos ou “ilegais” (do ponto de vista das restrições britânicas) que trasladaram 70.000 judeus. Metade deles foram apanhados por patrulhas britânicas. Os seus esforços intensificaram-se com as perseguições dos judeus da Europa sob o nazismo.  Neste quadro, os “Pans” foram os maiores navios.

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