Maria José Ferro Tavares
Ao contrário do que ocorreu noutros reinos da cristandade, os Judeus portugueses puderam dedicar-se à agricultura, quer como grandes proprietários absentistas, quer como médios e pequenos proprietários rurais. Entre os primeiros, encontram-se algumhas famílias de judeus cortesãos, como os Ibn Yahia, o rabi-mor Moisés Navarro, instituidor do primeiro morgadio pertencente a indivíduos da minoria, Isaac Abravanel e outros.
![]() |
Camadas mais abastadas de judeus foram grandes mercadores e financeiros da coroa, nobreza ou do clero |
Utilizados polos reis de Portugal no povoamento do reino, eles foram muitas vezes compelidos à aquisiçom de terras nos lugares onde se fixaram. Os Judeus de Bragança compraram propriedades na regiom, no tempo de D. Dinis (séculos XIII-XIV), no valor de 3.000 maravedis de ouro, para o plantio de vinhas.
O cultivo de videiras foi bastante corrente entre os Judeus, quer para a produçom do chamado «vinho judengo», consumido nas casas e nas tabernas das judiarias, quer para a exportaçom. Importante era também a existência de pomares que, no Algarve, visava a exportaçom de frutas secas, de olivais e de herdades de cereais. Eram também conhecidos criadores de gado miúdo.
![]() |
📷 Videiras da adega Quinta do Judeu (Douro) |
No entanto, a agricultura nom era a base da economia do agregado familiar judaico, como acontecia entre a maioria dos cristãos. Por isso, estes, nas cortes de Trezentos, se agravavam aos monarcas de que os Judeus nom aplicavam o seu capital na produçom agrícola.
De facto, umha parte importante da riqueza judaica era investida no empréstimo a juro, nos arrendamentos dos direitos reais, senhoriais e eclesiásticos, apesar de, neste último caso, tal ser interdito por direito canónico, no comércio e no artesanato.
Encontram-se integrados no comércio regional e local, quer como almocreves quer como pequenos mercadores que percorriam as diversas feiras regionais, vendendo e comprando, enquanto, em casa, a mulher e o resto da família mantinha aberta a loja ou a tenda inserida no pequeno comércio da localidade onde habitavam, e frequentada quer por Judeus, quer por cristãos. Por vezes, estas lojas e tendas extravasavam o espaço da judiaria e abriam-se na praça grande, como em Évora, ou na rua Direita do concelho, como em Santarém.
![]() |
Almocreve (arrieiro) foi um emprego exercido polos judeus galego-portugueses menos abastados |
Outros, os ricos mercadores cortesãos dedicavam-se ao comércio por grosso e só indiretamente praticavam o comércio a retalho. Frequentavam as feiras nacionais, mas sobretudo as da Península e da Europa e chegavam com as suas mercadorias ao paço real, ao castelo ou aos mosteiros e sés. Residiam, na sua maioria, em Lisboa, onde firmavam estrangeiros, nomeadamente italianos e flamengos.
Os descobrimentos portugueses permitiram a umha minoria de Judeus privilegiados, ligados ao rei, a D. Henrique ou à casa de Bragança, penetrar no comércio ao longo da costa de África ou nos monopólios régios do trato africano ou do açúcar madeirense, exportando-os para o Mediterrâneo ou para Antuérpia.
A grande maioria da populaçom judaica dedicava-se ao artesanato: ourives de ouro ou de prata, moedeiros da Casa da Moeda, aferidores de metais preciosos, ferreiros, latoeiros, alfagemes, armeiros, alfaiates, tecelões, sirgueiros, marceiros, iluminadores, douradores, sapateiros, curtidores, etc.
No entanto, nengum deles era homem de um só ofício, juntando à produçom oficinal, a venda direta na loja ou tenda e a venda ambulante. A estas atividades acrescentava-se ainda o empréstimo de dinheiro a juro o que provocava as queixas contra a usura praticada polos Judeus, ou o investimento monetário nos diversos lanços de arrendamentos.
Entre os Judeus abastados, encontra-se a dupla ocupaçom com fins lucrativos. Uns eram ricos mercadores e financeiros da coroa e das grandes famílias da nobreza ou do clero; outros eram médicos e notários que comerciavam e emprestavam dinheiro a juro.
Maria José Pimenta Ferro Tavares (Lisboa, 1945) é umha historiadora e professora portuguesa, especialista na história dos Judeus e dos cristãos novos em Portugal. Em 1998 foi a primeira reitora dumha universidade ou instituiçom de ensino superior em Portugal. As principais obras dela são "Os Judeus em Portugal no século XIV", Lisboa, Guimarães Editores (2000) e "Os Judeus em Portugal no século XV", Universidade Nova de Lisboa (1982-1984).
Fonte: Linhas de Força da História dos Judeus em Portugal UNED
Sem comentários:
Enviar um comentário