domingo, 23 de novembro de 2014

O QUE É O SIONISMO?

Meïr Weintrater

As palavras "sionismo" e "sionista" som habitualmente utilizadas, de maneira sistemática, em discursos nos que substituem a palavra "judeu". Trata-se dum recurso grosseiro destinado a ocultar o antissemitismo sem designar explicitamente os Judeus, na esperança de safar tanto os rigores legais quanto às condenações morais. Porém, este procedimento possui umha outra significaçom: ao apresentar o judeu como um elemento dum sistema desenvolve-se umha visom conspiracionista baseado no modelo dos "Protocolos dos Sábios de Siom".

Neste contexto, esta breve nota visa precisar o significado da palavra "sionista". Nom se trata de resumir a história do movimento sionista e das suas relações com o mundo, e muito menos descrever nalgumhas alinhas os conflitos israelo-árabe e israelo-palestiniano, mas responder às questões colocadas por pessoas de boa fé no que diz respeito à palavra "sionista" para designar pessoas e organizações.

Inventado na altura de 1890, pouco depois da apariçom do sionismo contemporâneo como corrente de ideias (meados do século XIX) e após o início da emigraçom sionista para a Palestina otomana (na década de 1880), a palavra "sionismo", derivada do nome que designa na tradiçom judaica Jerusalém o pe por extensom o país de Israel, aplica-se a um movimento que tem em comum a aspiraçom judaica do regresso à terra de Israel. Com a criaçom da Organizaçom Sionista Mundial (OSM) em 1897, sob o impulso de Theodor Herzl, o nome recebe a sua definiçom no programa da organizaçom: "O sionismo aspira à criaçom, na Palestina, dum lar para o povo judeu garantido polo direito público".

Porém, esta bela simplicidade terá pouca duraçom. No decurso do meio século que segue, assiste-se a umha verdadeira explosom nos usos desta palavra. Milhares de organizações judaicas engendram muitas declinações possíveis da palavra "sionista". Há sionistas de extrema esquerda (incluido um movimento marxista que se define como o "partido comunista judeu") e sionistas de extrema direita (incluído admiradores  do fascismo mussoliniano na sua primeira etapa), sionistas burgueses e sionistas proletários, sionistas religiosos e sionistas ateus, sionistas culturais e sionistas políticos, sionistas que apenas concebem o seu engajamento no quadro dum reagrupamento de todos os Judeus na terra de Israel e os sionistas que respondem à definiçom clássica do judeu que recebe o dinheiro dum outro judeu para encaminhar para um terceiro judeu na terra de Israel.

A OSM torna-se na casa comum de todos estes sionismos, embora o Partido Comunista Judeu se afaste dela durante um período relativamente breve ou a direita nacionalista rache com ela para criar a sua própria organizaçom internacional. Mas a OSM funciona acima de todo como um Parlamento, onde os partidos se confrontam ou cooperam segundo as circunstâncias. Celebram-se eleições regularmente em todos os países onde os movimentos sionistas estám presentes com base num título de adesom individual através do pagamento dumha quota simbólica. O equilíbrio de forças entre os diversos movimentos, durante muito tempo marcado por umha clara preponderância da esquerda sobre a direita e dos laicos sobre os religiosos, reflete-se na composiçom das instâncias executivas da OSM e da sua organizaçom irmã, a Agência Judaica para a Terra de Israel.
Sede da Agência Judaica para Israel em Telavive. CAEIRO
Durante o período de meio século que vai da criaçom da OSM ao nascimento do Estado de Israel em 1948 o termo "sionista" indica a pertença a umha estrutura fundada num consenso mínimo. O movimento sionista conta com simpatizantes que, como Léon Blum ou Albert Einstein, compartilham globalmente os seus objetivos sem fazer parte nos debates internos. Mas, para os sionistas militantes propriamente ditos, o horizonte de referência é a organizaçom específica à que pertencem. Isto é particularmente verdadeiro quando se trata de se posicionar em relaçom às forças políticas no mundo, para formular um projeto econômico e social para o futuro Estado judeu, para conceber as relações que este estado irá manter tanto com os seus vizinhos árabes quanto com os seus cidadãos árabes. Todos esses temas som objeto de consideráveis controvérsias no seio da grande família sionista, com toda a gama de opções existentes nas sociedades democráticas.

Durante esse período, nom existe "ideologia sionista" no sentido literal do termo, nem linha política ou modo de açom compartilhados por todos os sionistas. Os partidos sionistas som micro-sociedades, primeiro na Diáspora e cada vez mais na Palestina sob mandato britânico. Eles têm os seus movimentos de jovens, os seus jornais e publicações, os seus centros de treinamento para militantes, as suas redes de escolas e clubes desportivos. Eles também têm na Palestina, desde a década de 1920, os seus sindicatos, as suas fazendas coletivas, as suas empresas de seguros de saúde, as empresas que controlam e até os bairros onde constroem habitações para os seus aderentes.

No decênio de 1930, o centro de gravidade do movimento sionista muda para a sociedade judaica na Palestina com o apoio das organizações sionistas. Com a criaçom do Estado de Israel a mudança é consumada. As estruturas formais da OSM e da Agência Judaica continuam a existir, mas sem qualquer poder de decisom sendo gradualmente os seus poderes reduzidos apenas ao trabalho educativo na Diáspora. Em Israel, a palavra "sionismo" entra na história cultural do país, com entonações às vezes heróicas e às vezes irônicas. Nas comunidades da diáspora, as organizações que se definem exclusivamente como "sionistas" esmoreceram, já que o que antes era a sua singularidade (a emigraçom judaica para a Palestina, a ideia dum lar nacional judeu, o apoio à criaçom e a existência do Estado de Israel, a centralidade deste na vida judaica) é hoje inseparável do "mínimo comum" em que se reconhecem os membros de todas as comunidades judaicas.

Essa é a dimensão coletiva. No plano pessoal, quer em Israel, quer nas comunidades judaicas, o termo "sionista" quase nunca é usado de forma significativa como um marcador de opçom espiritual, ideológica ou política. Enquanto alguns judeus individuais se definem como "antissionistas", a sua atividade é de pequenos grupos e nom representam a realidade do ambiente judaico. Além disso, os Judeus (em número muito maior do que o anterior) definem-se como "sionistas", mas é difícil dizer em que se diferenciam doutros israelitas ou doutros judeus. Um judeu "sionista" pode ser religioso ou ateu, de esquerda ou de direita, um defensor da anexaçom da Cisjordânia por Israel ou, polo contrário, em prol dumha retirada de Israel de todos os territórios. Mais geralmente, um "sionista" pode ser um cidadão comum que apoia o direito de existência do Estado de Israel, e, neste sentido, a grande maioria dos europeus som sionistas.

NOTA:
O/a leitor/a que desejar completar as suas informações sobre este assunto poderá consultar as seguintes obras de referência (em francês):
"Histoire du sionisme", Walter Laqueur (trad. fr. Calmann-Lévy, 1973),
«Sionismes. Textes fondamentaux», reunidos e apresentados por Denis Charbit (Albin Michel, 1998)
«Une histoire intellectuelle et politique du sionisme, 1860-1940», Georges Bensoussan (Fayard, 2002)
«Le sionisme dans les textes»,Dominique Bourel e Delphine Bénichou (CNRS Éditions, 2008)
«Le sionisme»,Ilan Greilsammer (PUF, «Que sais-je»?, 2005)
«Qu’est-ce que le sionisme?»,Denis Charbit (Albin Michel, poche, 2007).

Informações tiradas do blogue do autor, traduzidas para o galego-português por CAEIRO.

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