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sábado, 11 de junho de 2016

DA ISLAMIZAÇOM PRÓ-PALESTINA PARA O CONSPIRACIONISMO ANTISSIONISTA

Pierre-André Taquieff

Para entender como se construiu, durante o período pós-nazista, umha nova configuraçom anti-judia numha Europa que professa o respeito incondicional polos direitos humanos, cabe fazer alguns desvios históricos e geográficos  ao abrigo tanto da história europeia quanto da atualidade mais. Nesta pesquisa, a linha vermelha está formada pola crescente islamizaçom da judeofobia, através do crescente papel desempenhado pola "causa palestiniana" no novo imaginário anti-judeu, partilhado por muçulmanos e nom-muçulmanos.

A "causa palestina" tornou-se destarte em causa árabe-islâmica, como um retorno às suas origens (décadas de 1920 e 1930), mas com um ponto de fixaçom construído como um mito repelente: o “sionismo", entidade demonizada erigida em inimigo universal (o "sionismo mundial") e Israel, o Estado considerado absolutamente ilegítimo e condenado à destruiçom. A reislamizaçom da "causa palestiniana", no contexto da ascensom do islamismo no mundo desde a década de 1990, tem sido fundamental para a produçom da nova judeofobia globalizada.

Neste contexto, velhas alegações anti-judias transmitidas pola tradiçom muçulmana foram reativadas e trazidas para o primeiro plano. Este é o caso do famoso hadith da rocha e da árvore que se acha na Carta Hamas:

"Deste modo, embora os episódios estejam separados uns dos outros, a continuidade do jihad quebrou-se polos obstáculos colocados pola constelaçom do sionismo, o Movimento da Resistência Islâmica [Hamas] aspira à realizaçom da promessa de Deus, seja qual for o tempo necessário. O Apóstolo de Deus –a quem o próprio Deus deu a bençom e paz- disse: "A Hora virá quando os muçulmanos tiverem combatido os Judeus (isto é, que os muçulmanos os tiverem matado), quando os Judeus se tiverem escondido atrás de pedras e árvores, e as pedras e as árvores tiverem dito: 'Muçulmano, servo de Deus! Um judeu está escondido atrás de mim, vem cá matá-lo. ' Umha única árvore será exceçom, o gharqad [tam espinhoso] que é umha árvore dos judeus "(hadith narrado por Al-Bukhari e e por Muslim)."

Na propaganda "antissionista" também se reciclaram as acusações de morte dos profetas, a falsificaçom dos livros sagrados, a propensom judia de mentir e de espalhar a corrupçom e a guerra civil.


Na propaganda "antissionista" também se reciclaram as acusações de morte dos profetas, a falsificaçom dos livros sagrados, a propensom judia de mentir e de espalhar a corrupçom e a guerra civil onde aparecem os estereótipos negativos indefinidamente explorados: os Judeus seriam enganosos e traidores (referindo-se ao conflito entre o Profeta e os Judeus de Medina), avarentos e crueis, inimigos de Deus e da humanidade, corruptos e corruptores.

Mas nom se deve esquecer que o fenómeno cultural de transferência de temas anti-judeus europeus para o mundo árabe-muçulmano, iniciado no final do século XIX, atingiu umha escala crescente no Próximo Oriente durante a luta dos Árabes contra o sionismo na sequência da Declaraçom de Balfour de 2 de novembro de 1917. A rejeiçom árabe e muçulmana da criaçom dum "lar nacional judeu" na Palestina foi imediata e alimentou-se ideologicamente polo uso de estereótipos e de temas acusatórios emprestados do corpus do antissemitismo europeu. Este é o caso da lenda do "assassinato ritual", o mito da "conspiraçom judaica mundial" ou a mais recente acusaçom de "racismo", que alimenta desde a década de 1970 a "nazificaçom" de Israel e do sionismo. Devido a estas inversões simbólicas, a fasquia ordinária do conflito israelita-palestiniano como um conflito estritamente político e territorial é enganosa. O conflito nom pode ser reduzido ao simples choque de dous nacionalismos rivais, envolvendo os conflitos de legitimidade mais ou menos superáveis. Goste ou nom, o conflito tende a tomar a figura dum conflito judaico-muçulmano.


Como demonstrado por umha série de estudos históricos, o primeiro momento do processo de transformaçom do antigo antissemitismo europeu para judeofobia antissionista dotada dum significado político encontra-se no período de entre guerras, particularmente durante a década de 1930, quando a temática anti-judia cristã-europeia entrou em síntese com o anti-judaísmo muçulmana teológico-religioso. Foi nessa altura em que a Irmandade Muçulmana liderada por Hassan al-Banna, o "Grande Mufti" de Jerusalém Haj Amin al-Husseini e vários líderes árabes, como o iraquiano Rashid Ali al-Gaylani, entraram em contato com os nazistas antes travar algumhas alianças que se revelaram totalmente durante a Segunda Guerra Mundial.

O medo dos Árabes muçulmanos, em seguida, gira em torno da transformaçom da Mesquita de Al-Aqsa numha sinagoga, boato que, desde o início da década de 1920 e sob várias formulações, continuou a causar tumultos, pogroms e derramamento de sangue.

A importaçom do antissemitismo europeu no mundo árabe-muçulmano, marcado notadamente pola primeira difusom d’Os Protocolos dos Sábios de Siom e da sua temática conspiracionista no Próximo Oriente, tomou um significado político desde o início dos anos 1920, quando os ideólogos do pan-arabismo e do pan-islamismo ligaram a questom palestiniana indistintamente à ameaça "judia" e "sionista" pairando sobre os Locais sagrados do Islã. O medo dos Árabes muçulmanos, em seguida, gira em torno da transformaçom da Mesquita de Al-Aqsa numha sinagoga, boato que, desde o início da década de 1920 e sob várias formulações, continuou a causar tumultos, pogroms e derramamento de sangue. Esta falsa acusaçom transmitida polo slogan "Al-Aqsa está em perigo", lançada e operada polo "Grande Mufti" de Jerusalém, foi a causa da segunda Intifada, antes de voltar no outono de 2015 para justificar umha nova vaga de ataques terroristas contra os israelitas. À denúncia da "ocupaçom" de Jerusalém ("Al-Quds" ou "al-Quds"), onde se acha o terceiro lugar santo do Islã, acrescenta-se a da "judaizaçom" da cidade assumida como muçulmana. A versom atualizada do slogan islamista é agora "Polo sangue vamos retomar a Al-Aqsa", fórmula mobilizadora juntamente com o grito de "Allahu akbar". A islamizaçom da "causa palestiniana" chegou a um ponto de nom retorno. A multiplicaçom de ataques palestinianos contra os israelitas sugere que umha terceira intifada está prestes a rebentar. É neste contexto que muitos líderes palestinianos arrastam para umha radicalizaçom dessa Intifada incipiente. No início de março de 2016, Abu Ahmad Fuad, vice-secretário geral da FPLP, saudou a ajuda iraniana às famílias dos palestinos "candidatos para o martírio": "Estas capacidades e esta ajuda vam levar a umha escalada da Intifada. Sim. E isso é o que queremos. (...) O candidato para o martírio deve saber que vamos cuidar da sua família. (...) Este apoio vai ajudar essas pessoas a continuar a luta e sacrifícios ".

Propaganda palestiniana chamando a defender Al-Aqsa
A anexaçom  islâmico-árabe simbólica do Monte do Templo representa a ultima manipulaçom palestiniana bem sucedida da questom de Jerusalém. O comité executivo da Unesco, reunido em Paris, adotou em 12 de abril de 2016 umha resoluçom proposta pola Autoridade Palestiniana afirmando que nom há nengumha ligaçom religiosa entre o povo judeu e o Monte do Templo e o Muro Ocidental (Muro das Lamentações). A resoluçom refere-se ao Monte do Templo como um local exclusivamente muçulmano, conhecido como a "esplanada das Mesquitas ". O texto, apresentado conjuntamente pola Argélia, Egito, Líbano, Marrocos, o Reino de Omã, Catar e o Sudám, acusa o Estado judeu de profanar a Mesquita de Al-Aqsa e de escavar "falsos túmulos judeus " nos cemitérios muçulmanos de Jerusalém. Com a Espanha, Eslovénia, Suécia e a Rússia, a França votou em prol deste texto de propaganda. Isto levanta umha acusaçom propagandística bem conhecida: a da "judaizaçom" e a "Israelizaçom" de Jerusalém, tópico privilegiado da nova propaganda "antissionista". A acusaçom foi feita nestes termos em 31 de março de 2016 por um jornalista militante da "causa palestiniana", Mohamed Salmawy:
"O que diz a UNESCO sobre as agressões ao património arquitetônico e religioso da cidade santa de Jerusalém? A judaizaçom e israelizaçom de tudo o que é árabe e muçulmano começou a despertar a ira da opiniom pública mundial em geral. Além disso, existem muitas declarações emitidas por partes conhecidas polo seu alinhamento cego com Israel, expressando a sua rejeiçom às agressões israelitas aos locais sagrados em Jerusalém, além do santuário de Abraão (a Caverna dos Patriarcas) ".

A 21 de outubro de 2015, a Unesco classificou a Caverna dos Patriarcas e o Túmulo de Raquel, dous locais sagrados judaicos em Israel, como locais muçulmanos do Estado palestiniano.

Este boato persistente dumha conspiraçom judaica para destruir um dos Lugares sagrados do Islã explica a centralidade e a recorrência da questom de Jerusalém no conflito político-religioso entre judeus e palestinos-muçulmanos.

Este boato persistente dumha conspiraçom judaica para destruir um dos Lugares sagrados do Islã explica a centralidade e a recorrência da questom de Jerusalém no conflito político-religioso entre judeus e palestinos-muçulmanos. Este tópico tem a vantagem, -para a propaganda palestiniana e as suas variantes islamitas-, de provocar mecanicamente a simpatia e solidariedade de todos os muçulmanos, sunitas ou xiitas, e de levá-los a trilhar "o caminho da jihad "para a defesa de Al-Aqsa. Os islamitas radicais há muito tempo integraram o tópico da acusaçom nos seus discursos de propaganda para alimentar um antissionismo radical e demonológico poderosamente mobilizador. Na mobilizaçom dos islamitas e dos seus círculos simpatizantes (dos passivos aos cúmplices) acresceta-se a mobilizaçom de vários meios políticos, indo da esquerda radical para a maioria dos grupos neofascistas ou neonazistas,  em favor da "causa palestiniana", com base numha demonizaçom de "sionismo" e de Israel.

A islamizaçom da "causa palestiniana" está em aceleraçom contínua desde a criaçom do Hamas em dezembro de 1987, o que lhe deu umha expressom organizada. Cabe lembrar o artigo 13 da Carta do Hamas, lançada em 18 de agosto de 1988? "A única soluçom para a causa palestiniana é o jihad." Esta islamizaçom jihadista tem o efeito de transformar um conflito político e territorial mumha  guerra sem fim, alimentada por paixões étnico-religiosas que afastam a busca de compromisso que apenas pode garantir umha paz precária entre judeus e palestinos (e em geral os estados árabe-muçulmanos).

Depois de anos de fantasias terceiro-mundistas, anti-israelitas e américanófobas, os intelectuais franceses confrontaram-se brutalmente com a realidade histórica polos ataques de 11 de Setembro, os massacres cometidos em nome do Islã na Síria e no Iraque ou os atentados de Paris de janeiro e de novembro de 2015. Este acordar brutal levou alguns deles a negar, minimizar ou relativizar os factos que nom encaixam no seu horizonte de expectativas. Daí a deriva conspiracionista. Se o espetáculo do mundo nom mostrar o quadro que é feito dele ou o contradizer, entom a tentaçom é grande de recorrer às "teorias da conspiraçom" que possuem a vantagem de parecer explicar o que nom se pode explicar e de preservar, destarte, os dogmas ideológicos e a sua aparente coerência. Os negadores dos ataques de 11 de Setembro mostraram o caminho.
Segundo as teorias da conspiraçom, as guerras surgidas na sequência da Primavera
Árabe tem carimbo sionista para enfraquecer os estados árabes inimigos de Israel.

Os conspiracionistas de hoje aplicam os mesmos esquemas interpretativos a eventos que perturbam ou contradizem a sua visom do mundo. Eles imputam, por exemplo, a apariçom do Daesh a umha vasta conspiraçom "sionista" para enfraquecer os Estados árabes e pôr em dificuldades o Irã. Ou mesmo eles sugerem que os ataques mortais de janeiro ou novembro 2015 som o resultado de manipulação dos serviços secretos, onde o Mossad é sempre bem colocado. Nas novas teorias conspiracionistas, os interesses "sionistas" funcionam como os "interesses de classe" na vulgata marxista ou os "interesses de raça " nas doutrinas racistas clássicas. Os "antissionistas" que afirmam serem anti-racistas reinventam assim um modo de acusaçom racista.
Segundo os conspiracionistas, o Estado Islâmico seria umha criaçom sionista!

Mais um exemplo de conspiracionismo antissionista em circulaçom nas redes sociais:
Surge a questom: Por que Israel nunca é atacado polo ISIS?

Pierre-André Taguieff é filósofo, cientista politólogo e historiador das ideias. Ele é diretor de investigaçom do CNRS, ligado ao Centro de Investigações Políticas da Sciences Po. Ele é o autor de Une France antijuive? Regards sur la nouvelle configuration judéophobe. Antisionisme, propalestinisme, islamisme, Paris, CNRS Éditions, 2015 et L'Antisémitisme, Paris, PUF, coll. «Que sais-je?», 2015

Texto tirado de RESILIENCE TV, traduzido para o galego-português por CAEIRO.

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