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sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

SANTIAGO DE COMPOSTELA

Santiago de Compostela, capital da Galiza, é umha cidade com cerca de 95.700 habitantes internacionalmente famosa como um dos destinos de peregrinaçom cristã mais importantes do mundo, na altura de Roma ou Jerusalém. 

Ligado a esta tradiçom, que remonta à fundaçom da cidade no século IX, a sua catedral, cuja construçom foi iniciada em 1075, alegadamente alberga o túmulo de Santiago Maior, um dos apóstolos de Jesus Cristo. A visita deste túmulo marca o fim da peregrinaçom, cujos percursos, os chamados Caminhos de Santiago ou Via Láctea, alastram por toda a Europa Ocidental. 

As peregrinações aumentaram grandemente a importância económica e política da cidade, tornando-se arcebispado em 1120. Libertada da tutela de Braga, a outra grande sé da Galécia, a hierarquia católica de Compostela passou a ter jurisdiçom por sobre a maioria de Leom e das Astúrias e acabou sendo centro dum grande senhorio feudal religioso. Mesmo Lisboa, libertada do domínio mussulmano em 1147, ficou oficialmente ligada como sufragánea à Arquidiocese de Compostela até 1394, altura em que a capital portuguesa é elevada para Sé Arquiepiscopal.

Desconhece-se exatamente quando assentaram os Judeus em Santiago de Compostela. Os Caminhos de Santiago supuseram um movimento continuado de peregrinos e mercadores procedentes de diversos países, de todas as classes sociais, jeitos de vida,... Mas para que tudo isto corresse bem, foi precisa a existência dumha importante estrutura, quer comercial, quer logística, em todo o caminho e em Santiago de Compostela. Esta situaçom, especialmente frutífera, motivou a apariçom da Judiaria de Compostela.

Os Judeus que se assentaram em Santiago de Compostela procuravam, em primeiro lugar, o comércio, pois a continuada chegada de peregrinos fazia precisa a presença de prestamistas, fraldários, mercadores,... e, em segundo lugar, a igreja, pois os altos hierarcas católicos precisavam joias, cálices, sacrários,... polo que joalheiros, ourives e fabricantes judaicos se instalaram em Compostela, conhecedores das procuras do clero. Porém, existe, ao menos na teoria, umha terceira e muito importante razom que justificaria a presença de Judeus em Compostela: a construçom da Catedral.

A catedral de Composela está cheia de referências ao povo e à religiom judaica. Por exemplo, no chamado Pórtico da Glória, obra-prima do românico europeu, está representado o povo judeu no extremo esquerdo enquanto no direito aparecem os gentios. Também aparecem talhadas muitas figuras do chamado polos cristãos "Velho Testamento", junto com as do Novo. No arco da esquerda, por exemplo, junto à imagem de Jesus Cristo pode-se distinguir a Eva e Adám e, logo a seguir, umha figura coroada que representa o patriarca Abraám, à que seguem a dos profetas Isaías, Jacob e Judá. No lado esquerdo aparece Moisés, segurando a Lei, acompanhado por Isaías, Daniel e Jeremias. Nos machones sobre os que descansa o arco lateral estám representados os profetas menores Oseias, Joel, Amós e Obadias. Na Porta das Pratarias torna-se a encontrar de novo Isaías (rodeando a Jesus Cristo), Moisés e Aarom, bem como o túmulo de Abraám. Mas, polo seu valor artístico, destaca a figura do Rei David, umha das obras-primas da arte medieval.

Na Idade Média as ornamentações dumha catedral nom se faziam apenas por questões estéticas, mas respondiam a umha complexa simbologia. Cada elemento tenta significar algo dentro do conjunto da catedral. Esta conceçom simbólica estava em ocasiões ligada aos princípios da Cabala.

É preciso levar em conta que na Idade Média a Bíblia era um livro interdito para o povo e que a presença dum grande número de personagens e passagens bíblicas apenas se justifica pola presença de artistas e pedreiros que conheciam as escrituras.

Parece justificada a participaçom de artesãos judeus na construçom da catedral de Santiago de Compostela durante o século XII. Porém, existe umha questom que põe em causa esta tese: a religiom judaica proíbe expressamente as imagens, deixando como única possibilidade dessa participaçom judaica em que fossem judeus convertidos ou estivessem assessorado por Judeus que nom executariam a obra, o que explicaria o profundo conhecimento dos princípios cabalísticos e da Bíblia. Alguns historiadores sustêm a tese de que o Mestre Mateus fosse de origem hebraica.
Localizaçom da Judiaria de Compostela. GoogleEarth
A Judiaria de Santiago de Compostela achava-se por trás da catedral. A partir da Praça de Cervantes saem as ruas que formavam a Judiaria compostelana, as Ruas Algália de Arriba e Algália de Abaixo e a Rua dos Truques que liga estas duas. No outro lado da praça acham-se a Ruela de Jerusalém e a Rua Troia. O limite do bairro judeu encontrar-se-ia na atual Capela das Ânimas e, a sul, com as ruelas e pequenas praças por volta da igreja de Sam Miguel dos Agros. 
Ruela de Jerusalém, na Judiaria de Compostela. Foto: Miguel Veny


Rua Nova na Judiaria de Santiago de Compostela. 
Fotos: Eva L. Parguinha
É possível que posteriormente, como no caso de Ourense, se deslocassem para o eixo Rua Nova e Entre-Ruas.
Ruas da Judiaria de Santiago de Compostela.
Enquanto o nome de Jerusalém resulta claramente identificável com o povo judeu, segundo alguns expertos o nome Troia nom provém daquela cidade da Ásia Menor, mas da denominaçom original de Torá.




Imagem: GoogleMaps
Rua da Troia na Judiaria de Compostela. GoogleMaps
No caso do nome Algália, esta palavra procede da arabizaçom da palavra hebraica "Cabala" (em árabe Alcabala), o que reforça a tese da existência de judeus estudiosos da cabala em Compostela e que estes aplicariam os seus conhecimentos na construçom da catedral.
R. da Algalia de Abaixo, na Judiaria de Compostela. GoogleMaps
R. da Algalia de Abaixo vista da R. dos Truques na Judiaria de Compostela
GoogleMaps
R. da Algalia de Arriba, na Judiaria de Compostela. GoogleMaps
Paradoxalmente à importância da catedral e as grandes possibilidades que oferecia a capital galega, a Judiaria de Santiago de Compostela teve um tamanho reduzido e com pouco peso dentro da judiaria galega.

É em Santiago de Compostela que tem lugar em 1520 a primeira referência ao Tribunal da Inquisiçom na Galiza, também chamado de Tribunal de Santiago. Nessa altura é nomeado o primeiro inquisidor no Reino da Galiza. A frieza ambiental que os inquisidores encontraram num reino tam tolerante fez fracassar a missom para a qual esse tribunal foi criado.


Porém, a chegada de conversos portugueses perseguidos pola Inquisiçom de Coimbra fez com que se enviasse um inquisidor especial para encarar a emigraçom judaica que de Portugal entrava na Galiza. Nessa altura delimita-se pola primeira vez a circunscriçom territorial do Tribunal de Santiago abrangendo os bispados de "Astorga, Tui, Mondonhedo, Lugo e Ourense". Mesmo assim, os sucessivos inquisidores fracassaram na sua tentativa de implantar o Tribunal.

É por isto que aos olhos da Inquisiçom em 1532 Galiza foi colocada sob o tribunal de Valhadolid, conhecido como o Santíssimo ofício de Castilla la Vieja e o reino de Leom. Todavia, os testemunhos recebidos da Galiza eram mui poucos e quando se produziam o Tribunal castelhano mal podia atuar.

Finalmente o Santo Ofício consegue estabelecer-se de vez em Santiago de Compostela em 1574. Nessa altura, os inquisidores sediaram-se no Palácio de Monte-Rei na Praça de Sam Miguel, lindando com a cerca oriental da horta do mosteiro de São Martinho Pinário. 

Doravante a perseguiçom contra os judaizantes galegos estendeu-se ao longo de todo o século XVII, com fases de especial beligerância (1604-11, 1616-21, 1624-31, 1634-41, 1654-64 e 1679-82). Na praça de Cervantes, muito pertinho da Praça de S. Miguel chegaram a realizar-se autos-da-fé, mantendo-se até os finais do século XVI a coluna por volta da qual se impartiam as penas e em cujo pé se localizava o cadafalso.

Dentre os processos da inquisiçom na Galiza cabe destacar o promovido contra os judaizantes em Ribadávia ou as investigações levadas a cabo na zona de Valdeorras, coincidindo com o aumento das perseguições em Portugal, o que fez com que os Judeus portugueses na sua fugida utilizassem Galiza, quer como via de saída para outras comunidades europeias mais tolerantes, quer como local de assentamento.

Em 1729 a Inquisiçom mudou-se para a Casa Grande do Hórreo ou de Calo, um prédio situado extramuros frente à Porta da Mámoa (no canto que hoje formam a R. do Hórreo e a R. da Fonte de Santo António).


Casa Grande do Hórreo/Casa da Inquisiçom de Compostela

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