segunda-feira, 8 de setembro de 2014

SOBRE O ANTISSIONISMO ANTISSEMITA DOS ANTI-IMPERIALISTAS

Moishe Postone

UM OUTRO OUTONO ALEMÃO. PARA A MANIFESTAÇOM CONTRA O ANTISSEMITISMO EM HAMBURGO A 13 DE DEZEMBRO DE 2009


Várias dezenas de grupos alemãos aderiram ao apelo de condena dos atos antissemitas feitos por uns grupos de esquerda durante a projeçom em Hamburgo no passado 25 de outubro de 2009 do filme de Claude Lanzmann "Pourquoi Israel": Parar os agressores antissemitas, mesmo os de esquerda! Umha manifestaçom a 13 de dezembro contra estes atos antissemitas teve lugar em Hamburgo.

MOISHE POSTONE
Eu acho que é politicamente importante que o máximo número de pessoas na esquerda leve a sério as expressões de antissemitismo que mostram os grupos que se consideram de anti-imperialistas. Talvez isto possa também levar para um longo e seródio esclarecimento teórico. A questom nom é que se possa ou nom criticar as políticas israelitas. As políticas israelitas deveriam ser criticadas, particularmete aquelas que visam atrancar qualquer possibilidade de criar um Estado palestiniano viável na Cisjordânia e em Gaza. Porém, a crítica do "sionismo" espalhada em muitos círculos anti-imperialistas vai além dumha crítica das políticas israelitas. Esta atribui a Israel e aos "sionistas" umha maldade única e um poder global conspirador. Israel nom é criticado como outros países som criticados, mas como a corporificaçom do que é profundamente e fundamentalmente o mal. Assim sendo, a representaçom de Israel e dos "sionistas" para esta forma de "anti-imperialismo", de "antissionismo", é essencialmente a mesma que a dos Judeus no antissemitismo virulento que encontrou a expressom mais dura no nazismo. Nos dous casos, "a soluçom" é a mesma: a eliminaçom no nome da emancipaçom.

A representaçom convencional estalinista e social-democrata do nazismo e do fascismo como simples ferramentas da classe capitalista, utilizada para quebrar as organizações operárias, omitia sempre umha das suas dimensões centrais: estes movimentos em termos de autocompreensom deles próprios e o seu apelo às massas, eram as revoltas. O nazismo apresentou-se como umha luta pola libertaçom (e apoiou movimentos "anti-imperialistas" no mundo árabe e na Índia). O fundamento desta autocompreensom era umha compreensom fetichizada do capitalismo: a dominaçom abstracta, intangível, global do capital foi entendida como a dominaçom abstracta, global, intangível dos Judeus. Longe de ser simplesmente um ataque contra umha minoria, o antissemitismo dos nazistas é concebido como anti-hegemónico. O seu fim era libertar a humanidade da dominaçom omnipresente e desapiedada dos Judeus. É do facto do seu carácter anti-hegemónico que o antissemitismo coloca um problema particular para a Esquerda. É a razom pola qual há um século o antissemitismo podia ser caracterizado como "o socialismo dos imbécis". Hoje pode ser caracterizado como o "anti-imperialismo dos imbécis".

Infelizmente esta forma antissemita de "antissionismo" nom é nova. Acha-se no centro dos processos espetaculares estalinistas do início dos anos 1930, particularmente na Checoslováquia, quando os Comunistas internacionalitas que amiúde eram os Judeus, foram acusados de "agentes sionistas" e executados por isso. Esta forma codificada de antissemitismo, cujas origens nom têm qualquer relaçom com as lutas do Próximo Oriente, foi entom para lá transportada pola Uniom Soviética e os seus aliados durante a Guerra Fria, particularmente polos serviços secretos da RDA que travalhavam com os seus clientes Ocidentais e do Próximo Oriente (por exemplo, a RDA e os grupos palestinianos "radicais" diversos).

Esta forma de antissionismo "esquerdista" convergeu com o nacionalismo árabe radical e o islamismo radical, que nom é mais progressista do que qualquer umha outra forma de nacionalismo radical, como o nacionalismo radical albanês ou croata, e para que a impulsom eliminadora face os Judeus de Israel se justifique como dirigida contra os colonizadores "europeus". Cada vez que a impulsom eliminadora face os Judeus de Israel for mais forte, a legitimidade de Israel é posta em causa, com argumentos que vam da afirmaçom de que a maior parte dos Judeus europeus nom som biologicamente do Próximo Oriente (umha afirmaçom feita em 1947 polo Alto Comité Árabe e agora retomada como umha "nova descoberta" por Shlomo Sand) à ideia de que eles simplesmente som colonizadores europeus que, como o "pied noir", deveriam ser reencaminhados para casa. É mágoa e surpreendente que estes nacionalistas radicais no Próximo Oriente vejam a situaçom nestes termos. No entanto, isto torna-se perverso quando os Europeus, mormente os Alemãos, identificam os Judeus, o grupo mais perseguido e massacrado polos Europeus durante um milênio, com esses europeus. Ao identificar os Judeus com o seu próprio passado assassino, estes Europeus podem esquivar o tratamento desta pesada carga. O resultado é um discurso que pretende combater o passado, mas que na realidade o continua e prolonga. Esta forma de antissionismo faz parte dumha campanha que ganha em força desde o início da Segunda Intifada, para eliminar Israel. O seu posicionamento sobre a fraqueza dos Palestinianos cobre esta intençom suprema. Esta forma de antissionismo faz parte do problema e nom dumha parte da soluçom. Longe de ser progressista, alia-se com os nacionalistas árabes radicais e os islamistas, quer dizer, a direita radical do Próximo Oriente e, assim, reforça a direita israelita. É constitutivo dumha guerra a cada vez mais definida em termos de suma zero, que mina qualquer soluçom política possível, é a receita para umha guerra infinita. O ódio exprimido por este antissionismo faz quebrar as fronteiras da política, por ser tam ilimitada como o seu objeto imaginado. Semelhante facto de ser ilimitado indica um sonho de eliminaçom. Os Alemãos, como muitos outros Europeus, conhecem muito bem este sonho de eliminaçom. É chegado o tempo de acordar.

Moishe Postone (n 1942) é teórico crítico e professor de história na Universidade de Chicago. Ele é conhecido tanto pola sua interpretaçom do antissemitismo moderno quanto pola sua reinterpretaçom da teoria crítica marxiana. É o autor de "Time, Labor and Social Domination: A reinterpretation of Marx’s critical theory" (1993).

Fonte: PALIM PSAO, traduzido para o galego-português por CAEIRO.

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