domingo, 13 de outubro de 2013

GUARDA

Guarda é umha cidade portuguesa com cerca de 26.600 habitantes que conserva um bonito centro histórico e que comemorou em 1999 o 800 aniversário da sua repovoaçom, efetuada por vontade do rei D. Sancho I, que lhe concedeu foral no ano 1199.

Como o seu próprio nome indica, a sua importância foi grande do ponto de vista defensivo, bem como centro administrativo e comercial do amplo território reconquistado aos mouros.

É a cidade mais alta de Portugal e está situada no cimo dumha montanha, o que lhe proporcionou umha posiçom estratégica em relaçom com a linha fronteiriça.

A comunidade judaica da Guarda foi durante longos períodos umha das mais importantes de Portugal e é considerada umha das mais antigas.




A primeira referência à comunidade judaica na Guarda surge no século XII, mencionada no foral de 1199, sendo a partir do século XIII que a sua existência se encontra documentada. Por exemplo, o aforamento, por parte do rei D. Dinis de casas da freguesia de S. Vicente a famílias judaicas, tendo sido numha delas instalada a sinagoga. Esta seria a Judiaria Nova da Guarda, surgida como prolongamento da Judiaria Velha antes referida. Posteriormente a comunidade judia da Guarda recebe cartas de confirmaçom por parte de Pedro I e D. Fernando.

Lá chegaram os Judeus traídos pola atividade económica e comercial gerada ao ser o centro dumha grande zona de produçom agrícola e gadeira e pola sua situaçom estratégica. 

Já no século XIV ter-se-á verificado um crescimento da judiaria para Norte e para Leste, mas é a partir de finais do século XV, e devido aos levantamentos anti-judaicos que assolaram Castela, que a judiaria apresenta maior crescimento, tanto na área ocupada, como no número de habitantes. O facto de existir referências a umha Rua Nova da Judiaria, representando a expansom da judiaria para Norte, é um claro indício que a comunidade da Guarda possui uma extensom considerável. Em fins do século XIV aí residiam cerca de 200 pessoas.

Esta comunidade, que constituía um mundo à parte dentro da cidade, terá possuído no seu interior a maior parte das estruturas judaicas que as comunas usualmente possuíram. A judiaria da Guarda dispunha dumha Atafona própria, dous Açougues, da sua Sinagoga e do respetivo Mikvé ou espaço para banhos rituais, bem como de um Cemitério ou dum espaço de enterramento para os membros da comunidade.

Os judeus dedicavam-se a todo tipo de ofícios e atividades que muitas vezes foram reguladas. Destaca a grande presença de sapateiros, umha grande predominância de mercadores, e dum tendeiro essenciais na área da comercializaçom da agricultura de e produtos de primeira necessidade. Encontramos igualmente rendeiros ligados à actividade agrícola e também profissionais da área da saúde e da ciência, como físicos e cirurgiões.

Alguns judeus moravam em casas que eram propriedade do rei, que as arrendava, e viviam agrupados a maioria na judiaria. A arquitetura das casas responde ao seguinte esquema: com dous pisos, o térreo destinado ao comércio e o primeiro andar à habitaçom, e a existência de duas portas, umha larga para o negócio, outra estreita para a família.
Planta da cidade da Guarda 

Esta é a fasquia das casas localizadas Judiaria Nova da Guarda, abrangendo um espaço urbano compreendido desde a Porta d'el-Rei (que ainda se conserva) até onde hoje se acha o adro da igreja de São Vicente, e limitada pola muralha e pola Rua Direita que dava acesso àquela Porta. Algumhas das ruas importantes dentro do perímetro da judiaria seriam a Rua Direita, a Rua que vai dos Açougues Velhos para o Paço Real, a Rua de São Vicente, a Rua da Judiaria e a Rua dos Açougues.

A implantaçom da judiaria nom interferia com os dous eixos estruturantes da cidade: a R. de S. Vicente (L-O) e a R. Direita (N-S), em cuja interseçom se situava a igreja e adro de S. Vicente.

As famílias tinham nomes como Ergas, Castro, Falilho, Baruc, Mocatel, Marcos, Querido, Alva, Cáceres, Castelão, etc.

Porta do Sol (da Erva na atualidade),
umha das entrada com acesso ao bairro judeu

Na tradiçom popular existe a lembrança dum sapateiro judeu do séc. XIV, chamado Pero Esteves ou "Mendo da Guarda", o pãe de Inês Pires, com quem o Mestre de Avis, o futuro rei Dom João I (1385-1433), teve um filho bastardo em 1377. A lenda diz que o pai de Inês, desconforme com o caso da filha dele, jurou que nunca se iria barbear, polo que posteriormente foi conhecido de "Barbadão". Muito perto do bairro judaico, na atual Rua Dom Sancho ainda existe a famosa "Casa do Barbadão". É a partir desta rama da casa de Avis que surge o Ducado de Bragança.

Em 1405 o rei D. João I ordena que os judeus usem umha estrela vermelha de seis pontas ao peito, estranhamente mais tarde vem recuar, revogando essa mesma lei após alegados abusos das autoridades. Em 1435 sabe-se que os Judeus se estenderam pola Rua que corria dos Açougues para o Paço Real e por travessas, como a Rua dos Açougues, adjacente à muralha da cidade, e pola Rua Direita, paralela à Porta de El-rei. Porém, devido aos protestos dos cristãos, em 1465 a porta principal da Judiaria é fechada, substituindo-a por outra em lugar menos concorrido.

Antes da expulsom dos judeus em Espanha (1492), Guarda acolheu famílias de judeus procedentes de Aragom, Andaluzia, Cáceres e outros lugares. No século XV a comunidade judaica já rondaria entre os 600 e os 850. Com a expulsom dos reinos de Espanha, esta populaçom aumenta exponencialmente. Os peleteiros vindos de Salamanca introduziram as suas habilitações na manufatura regional que ainda se mantém na atualidade.

Como noutras as povoações portuguesas, também a comunidade judaica da Guarda, em 1496, teve de optar pola fuga ou pola conversom, mesmo que aparente, levando ao aparecimento dos chamados cristãos-novos e do cripto-judaismo. Alguns terám fugido, mas outros permaneceram na cidade. Terám até saído da judiaria, espalhando-se por novas ruas, mas continuando a judaizar, apesar das proibições. E por isso que as audições perante o Tribunal da Inquisiçom decorriam nas igrejas de S. Vicente e S. Pedro. 

Mapa da Guarda indicando a vermelho o atual bairro judeu. GoogleMaps
Desde sempre localizado no interior da cidade muralhada, ainda hoje aí existe o antigo bairro judeu, muito perto da Porta d’El-Rei, e composto pola Rua do Amparo e da Trindade, estando contornado polas ruas S. Vicente e Francisco de Passos. Os judeus tinham lá um mundo a parte, isolado do resto da cidade, podendo fazer-se o seu acesso só por duas ruas (umha delas o Poço do Gado). 


A Rua do Amparo é o eixo central do bairro judeu da Guarda

Na imagem, zona de âmbito judaico da Guarda. Google Earth

Hoje o bairro judeu da Guarda é um dos recantos mais castiços. Os edifícios som modestos e apresentam umha feiçom rural. O comércio e o desenvolvimento agrícola modificam esse rurismo, introduzindo a arquitetura pesada dos sécs. XVI e XVII, com cornijas salientes, gárgulas de canhom, pátios vastos e salões amplos.



No século XVIII, entre 1730-35, intensifica-se a perseguiçom aos judeus, aumentando as marcas cruciformes na judiaria. Um estudo de novembro de 2006, editado pola Sociedade Pólis Guarda e pola autarquia local, identifica 48 marcas cruciformes em edifícios da zona da Judiaria.


A Rua da Trindade, umha das outras ruas da judiaria. Imagem de Gloria Ishizaka


1 comentário:

  1. Há claros sinais da presença judaica nas aldeias à volta da antiga vila do Jarmelo, inclusive as conhecidas marcas nas casas. A região parece ter sofrido com a perseguição imposta pelas conveniências político-religiosas que tanto marcaram a história de Portugal.

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